São Paulo, quinta-feira, 21 de agosto de 1997
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Prós e contras do Brasil

CELSO PINTO

Não é difícil entender as razões que têm levado multinacionais a investir no Brasil. A estabilização, que trouxe uma explosão no consumo, animou várias empresas a se instalar aqui, com ou sem ajuda do governo. Outras estão aproveitando oportunidades únicas, abertas pela privatização, para entrar em mercados estratégicos, ainda que isso custe um prêmio.
Menos óbvio, mas igualmente importante, é descobrir as razões de algumas multinacionais para não entrar no Brasil. Um alto executivo de um gigante americano na área de tecnologia de ponta é claro sobre esse ponto.
Novas unidades produtivas, ao redor do mundo, significam, para este grupo, um investimento mínimo de US$ 1 bilhão a US$ 3 bilhões. O mercado brasileiro parece grande, mas, no caso de produtos de ponta, é pouco significativo. Somando o consumo direto e indireto dos produtos desse grupo no Brasil, ele não supera US$ 200 milhões ao ano. Entrar no mercado brasileiro só faria sentido como uma plataforma de produção internacional integrada, como é o caso de unidades que esse grupo tem ao redor do mundo.
Para isso, diz o executivo, é vital ter regras do jogo estáveis e confiáveis no comércio exterior. Isso, a seu ver, o Brasil não tem. Um exemplo: em apenas um dia de contatos em São Paulo, esse executivo ouviu três interpretações absolutamente distintas sobre quais seriam as regras vigentes, hoje, para a importação de um produto específico de sua empresa.
É claro que ele defende, também, a inexistência de tarifas de importação e absoluta liberdade de comércio, mas isso, na prática, seu grupo não encontra em todos os países onde opera. Crucial, mesmo, é ter regras transparentes e confiar que elas não mudarão.
Na hierarquia dos fatores que pesam na escolha de um país e não de outro como sede para uma nova unidade produtiva, um ponto crucial é a disposição do governo local, ou de sócios locais, de oferecer vantagens, fiscais e financeiras, que diluam os custos e os riscos. O fato de uma grande unidade produtiva do grupo estar na Itália se explica pela generosa parceria oferecida pelo governo italiano.
Outros fatores são mais previsíveis. É preciso haver uma boa infra-estrutura econômica e uma oferta adequada de mão-de-obra qualificada. O mercado interno também conta, assim como a qualidade da política econômica.
No Sudeste Asiático, segundo esse executivo, os países realmente tentadores são Coréia, Cingapura, Taiwan, Indonésia (pelo mercado) e, até certo ponto, a Malásia. A China, na análise do grupo, embute muitos riscos. A crise monetária vai afetar temporariamente a região.
Ele não é pessimista em relação ao Brasil. Ao contrário, acha que houve um impressionante avanço no sentido da estabilidade econômica e vê no presidente várias qualidades de liderança. Daí a colocar US$ 1 bilhão numa fábrica aqui, contudo, vai uma distância muito grande.
O que virá da Ásia
Que a crise monetária asiática vai afetar a inflação e o crescimento em diversos países e abalar a credibilidade da região, não há dúvida. A crise já foi muito mais longe do que se imaginava no início e liquidou o regime cambial da região.
O último país que continua com sua moeda atrelada formalmente ao dólar é Hong-Kong e até esta sólida ilha chinesa foi atacada pelos especuladores. Todos os outros países tiveram que deixar suas moedas flutuarem.
Para se ter uma idéia, comparando a inflação anual média no período 1990-96 com a desvalorização anual média, os números na Tailândia são 5,1% e 0%; nas Filipinas 10,6% e 2,3%; na Indonésia 8,6% e 4,1%; e na Malásia 4% e menos 0,9%. Ou seja, houve uma forte valorização cambial em todos os países.
Comparando as cotações antes da crise de julho até ontem, a desvalorização já chegou a 27,5% na Tailândia, 13,7% nas Filipinas, 13,5% na Indonésia e 9,7% na Malásia. Crises monetárias costumam provocar, de início, desvalorizações maiores do que pareceria razoável. Com o tempo, elas acabam amenizadas.
O fato, contudo, é que a correção tende a dar um novo alento de competitividade às exportações, especialmente frente à forte concorrência da China, cuja moeda continua controlada. Se valem o exemplo europeu, depois da crise de 92, e o mexicano, depois da crise de 94, as exportações asiáticas poderão ter um novo impulso. O que seria mais uma má notícia para as contas externas brasileiras.

E-mail: CellPinto@uol.com.br

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