São Paulo, domingo, 24 de agosto de 1997
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O pouco caso com os menores de rua

ANTONIO ERMÍRIO DE MORAES

O problema do menor tem sido objeto de preocupação dos homens públicos só na época das eleições. Nas campanhas, os candidatos prometem mundos e fundos. Os recém-eleitos criam novos órgãos, com generosos cabides de emprego, mas os menores continuam abandonados.
Em São Paulo, vivemos uma verdadeira calamidade pública. As crianças se arrastam nas calçadas à cata de drogas e esmolas, muitas vezes exploradas pelos próprios pais. É claro que ninguém faz isso por que quer.
A Folha de 18/8 publicou dados estarrecedores sobre a situação dos menores de rua. Na região da Estação da Luz, 31% das crianças se dedicam ao furto diariamente e 66% são usuárias de drogas. Vejam bem: estamos falando, na sua maioria, de crianças entre 7 e 15 anos de idade.
Das crianças pesquisadas, a maior parte não frequenta a escola. Cerca de 55% raramente ou nunca retornam para seus domicílios. A rua é a sua casa. Elas mendigam durante o dia e dormem durante a noite nas vias públicas.
É claro que o abandono do menor é apenas a ponta do iceberg de um gigantesco problema social. E, nesse ponto, logo surgem os que apontam o desemprego e a má distribuição de renda como causas dessa vergonha nacional.
Não há como negar que o menor de rua é consequência de uma problemática mais séria. Da mesma forma, não há como esconder que grande parte de seu abandono reflete a falência das instituições públicas, em especial a escola.
Alguns governos estão mostrando que o problema pode ser bastante atenuado por meio de programas específicos como é o caso da "Bolsa-Escola" e "Poupança-Escola". Por meio deles, as famílias recebem uma ajuda em dinheiro para manter as crianças na escola e ali apresentarem um bom aproveitamento. A ausência às aulas ou o fraco desempenho são motivos de suspensão da referida ajuda.
Tais programas estão na fase experimental em várias cidades do Brasil como Brasília, Vitória, Belo Horizonte, Belém, Manaus, Campinas e Ribeirão Preto.
No caso de Brasília, cerca de 98% das crianças estão ficando na escola e apresentando um bom rendimento escolar (dados da Secretaria da Educação do Distrito Federal de 14/7/97).
Dizem que essa é uma solução cara, pois a importância passada à família varia entre R$ 50 e R$ 120 por mês. Mas temos que indagar o que custa mais caro: os programas ou o abandono de nossas crianças. Não seria o caso de destinar uma parte do salário-educação (2,5% sobre a folha de salários) para esse fim?
Ainda é cedo para tirar conclusões definitivas sobre tais experiências. Mas uma coisa é certa. Os governos e a sociedade terão de acudir os menores abandonados se quisermos viver em paz e tratar os seres humanos com dignidade.
Os direitos humanos começam aí, ou seja, no modo de tratar a criança. Pouco adianta demonstrar nosso apego aos direitos dos criminosos se nada fazemos para evitar a criminalidade e a delinquência juvenil. Que tristeza!

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