São Paulo, segunda-feira, 25 de agosto de 1997
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O que há de novo?

JOÃO SAYAD

Mas, afinal de contas, o que há de realmente novo na economia do mundo nos últimos tempos? O comércio internacional cresceu e nos impressiona muito quando tomamos vinho francês ou comemos queijo argentino. Mas não ultrapassou os níveis atingidos no começo deste século, quando importávamos estações de trem inteiras, desde os bancos até os banheiros. Comércio internacional pode ser bom, mas novo não é.
Os investimentos multinacionais entre os países do Primeiro Mundo também não são novidades. Nem os investimentos multinacionais do Primeiro Mundo no Terceiro Mundo, ainda que, nesse caso, os motivos possam ter mudado.
Antes, a United Fruit ia investir onde houvesse sol para plantar bananas. Hoje, as montadoras de automóveis e as produtoras de eletrodomésticos têm que ficar próximas dos mercados consumidores.
Talvez possamos chamar de novidade o crescimento do sudeste da Ásia, depois do fim da Guerra do Vietnã e com o crescimento do Japão.
O desemprego também não é novidade. Começamos o século chamando os desempregados de preguiçosos. Depois, insistimos que o desemprego só existia por causa da teimosia dos sindicatos e dos salários nominais rígidos.
O mundo se preocupou efetivamente com o desemprego depois da crise dos anos 30 e até 1979, mais ou menos. O desemprego se reduziu e a inflação aumentou.
Depois de 1979, a inflação se tornou a única prioridade e o desemprego aumentou. Nada realmente de muito novo: é o funcionamento da antiga e conhecida curva de Philips.
A mobilidade do capital financeiro entre todos os países do mundo também não é coisa nova. Leiam a vida do barão de Mauá ou lembrem-se dos Rotschilds, que financiaram por muito tempo o café brasileiro.
Na realidade, foi depois da confusão dos anos 30 e da Segunda Guerra Mundial que se decidiu que a mobilidade de capitais financeiros era prejudicial à estabilidade da economia. As proibições à mobilidade do capital foram sendo ultrapassadas pelo crescimento do comércio internacional e acabaram gerando o mercado do eurodólar, nos anos 60, e a ampla mobilidade financeira dos anos 80 e 90.
A grande novidade do nosso período são as taxas de câmbio flexíveis. Antes de 1918, tínhamos câmbio fixo e padrão-ouro. Depois de 1918, tentamos restabelecer o padrão-ouro, gerando muita confusão. O desemprego já havia se transformado em problema político e social, e a Inglaterra já não era o centro do mundo. A tentativa de restabelecer o padrão-ouro para o mundo diferente de 1918 gerou apenas grandes inflações e desemprego e foi fator importante para a crise de 1929.
Depois de 45 e do acordo de Bretton Woods, a taxa de câmbio do dólar ficou fixa em termos de ouro, e as demais moedas adotaram câmbio fixo no curto prazo e variável no longo prazo, com o FMI regulando os mercados financeiros internacionais.
Hoje, temos mobilidade do capital financeiro e taxas de câmbio flexíveis. Essa é a grande novidade.
Como é que esse sistema funciona? Não existem regras explícitas ou gerais. Cada crise é uma crise, que os bancos centrais vão resolvendo com ou sem o apoio do FMI.
Na Europa, Estados Unidos e Japão, desvalorizações cambiais têm gerado crescimento maior e desemprego menor. Valorizações cambiais geram a "disciplina" do desemprego e a redução da taxa de inflação.
Nos países subdesenvolvidos, os efeitos das variações cambiais não são homogêneos.
No México, desvalorização cambial gerou inflação e mais instabilidade cambial. A Argentina voltou ao tempo do padrão-ouro e, portanto, não admite nenhuma variação cambial. No sudeste da Ásia, desvalorização cambial gerou, até agora, instabilidade cambial com pouca inflação. Mas esses países nunca tiveram inflações latinas como nós.
No Brasil do Plano Real, desde março de 1995 a variação cambial continua sendo periódica, como era antigamente. A novidade são os grandes déficits em conta corrente.
Vivemos em dúvida. Será que, quanto mais aguentarmos essa taxa de câmbio, menores serão os impactos inflacionários que uma variação cambial pode causar? Ou será que, com o passar do tempo, ficaremos mais parecidos com a França ou a Inglaterra, onde a desvalorização cambial gera crescimento sem inflação?

E-mail: jsayad@ibm.net

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