São Paulo, terça-feira, 26 de agosto de 1997
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RAP

CAMILO ROCHA
ESPECIAL PARA A FOLHA

O filme é conhecido: a banda é cool e consagrada pelo público e pela crítica, aí um dos membros importantes resolve aproveitar o empurrão e tentar um vôo solo.
Já deu em caca: David Byrne (paralelo aos Talking Heads) e Mick Jagger (tropeçando longe dos Rolling Stones). E já deu em boas surpresas: George Michael enquanto ainda era Wham! e Bryan Ferry fazendo dobradinha com seu Roxy Music. O primeiro disco solo de Wyclef Jean, da banda Fugees, prova que ele pertence ao segundo grupo.
Uma das coisas que mais chamam a atenção em "The Carnival", seu primeiro disco solo, é como as referências de Jean mostram-se amplas.
Afinal, quantos discos de hip hop você conhece que contam com a participação da Orquestra Filarmônica de Nova York?
E é bom esclarecer desde já que o disco não tem nada a ver com os Fugees, com aquela languidez soul, aqueles ritmos secos -apesar de os outros dois integrantes da banda, Lauryn Hill e Pras, participarem do disco.
O pano de fundo é a tradição carnavalesca de suas raízes caribenhas (Jean é haitiano).
Mas, enquanto para seus conterrâneos das ilhas o Carnaval é uma válvula de escape contra uma realidade sofrível, Wyclef Jean trouxe os dois lados da moeda -diversão e dureza- para cima de seus beats.
No disco há histórias sobre repressão policial, mas também uma folgada versão da festeira clássica "Guantanamera" (com canja da veterana Celia Cruz).
Há a vinheta cômica "Killer MC", em que perguntam a um "gangsta rapper" como ele ainda não foi preso se diz que matou mais de um milhão de pessoas em seu último disco.
E mais adiante há "We Trying to Stay Alive", que utiliza como base, isso mesmo, o standard da disco music "Stayin' Alive", dos Bee Gees.
"Apocalypse" ganha o prêmio de sample mais inesperadamente absurdo.
Retirado de "Concerto for One Voice", de Christian Langlade, será instantaneamente reconhecida por qualquer um como a música do comercial do xampu Vinólia nos anos 70.
E só para esfregar mais ainda na cara da gente sua polivalência cosmopolita, Jean está inspirado como nunca com sua belíssima guitarra, faz rap em francês fluido em "Sang Fézi" e apresenta, como convidados, feras como Neville Brothers, Funkmaster Flex e as I Threes, backing vocals de um certo Bob Marley.
Assim como o povo faz uma festa glamourosa e brilhante -o Carnaval- a partir do refugo e dos restos, Wyclef Jean colheu todo tipo de resíduo do pop para conceber um riquíssimo banquete auditivo.

Disco: The Carnival
Artista: Wyclef Jean (com os Refugee Allstars)
Lançamento: Sony
Quanto: R$ 18, em média

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