São Paulo, quarta-feira, 27 de agosto de 1997
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Flexibilidade do trabalho

ANTONIO DELFIM NETTO

Uma das coisas mais importantes para o exercício da política econômica reside no conhecimento empírico da realidade onde ela se processa. No Brasil, felizmente, isso parece estar acontecendo. A cada dia novas pesquisas vão revelando se certas premissas construídas a partir de preconceitos são ou não verdadeiras. Ao contrário da maioria, alguns economistas suspeitavam que a flexibilidade do nosso mercado de trabalho era superior à de muitos países desenvolvidos.
O número 4, de abril deste ano, do boletim "Mercado de Trabalho", uma publicação conjunta do Ministério do Trabalho e do Ipea, traz um interessantíssimo artigo ("Uma avaliação empírica do grau de flexibilidade alocativa do mercado de trabalho brasileiro") de autoria de quatro economistas aparentemente coordenados pelo sr. Ricardo Paes de Barros, a quem já devemos outros estudos da mesma qualidade e utilidade.
No artigo são construídos dois indicadores para caracterizar o mercado de trabalho: 1) um indicador de turbulência, que mede como variou a porcentagem do emprego entre dois pontos no tempo (no caso um ano) nos vários segmentos da economia e 2) um indicador de descasamento, que mede a distância entre os índices de desemprego de cada segmento da economia com relação ao índice de desemprego total.
Como é evidente, o primeiro indicador mede a importância dos choques a que se sujeitou a economia na unidade de tempo e o segundo mede a velocidade com que ela se ajustou àqueles choques.
Um índice maior de turbulência significa que a economia está sujeita a grandes choques que exigem substancial transferência de emprego entre os vários segmentos. Um índice menor de descasamento significa que o mercado de trabalho conseguiu realizar a transferência em menor tempo. A tabela abaixo mostra o valor dos indicadores para alguns países:

O quociente entre os dois indicadores é uma medida sintética da capacidade de ajuste: se os choques forem grandes (alta turbulência) e os descasamentos forem relativamente pequenos, o quociente cresce, dando uma idéia da "flexibilidade" do mercado de trabalho. Vemos que o mercado de trabalho brasileiro tem uma capacidade alocativa semelhante à da Austrália, Estados Unidos e Suécia e consideravelmente superior à dos outros países da tabela.
Os autores do trabalho concluem, corretamente, que "as intervenções no mercado de trabalho no Brasil devem estar muito mais voltadas à busca da melhoria na qualidade dos postos de trabalho oferecidos e na qualidade e capacitação da mão-de-obra do que propriamente voltadas para a redução do seu grau de viscosidade ou fricção".

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