São Paulo, sábado, 30 de agosto de 1997
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Comandante perdeu filha caçula em 1932

ARMANDO ANTENORE
DA REPORTAGEM LOCAL

Se colecionou elogios dos superiores pelo desempenho na Revolução de 1932, Alfredo Feijó também amargou inimizades enquanto integrou a Força Pública.
Certo dia, ninguém sabe precisar quando, o coronel recebeu um misterioso pacote em casa. Era pequeno e não trazia nenhuma indicação do remetente.
Mal abriu o embrulho, o oficial deu de cara com a réplica em papelão de um esqueleto humano -que usava quepe e túnica militar e exibia, de cima a baixo, alfinetes espetados à maneira dos bonecos de vodu.
Quem conta a história é Jesseney Feijó, um dos sete filhos do coronel. A Folha o localizou no início da semana em São Paulo.
Ney -todos o chamam assim- tem 77 anos e apenas um irmão vivo. Antes de se aposentar, fez carreira como administrador de empresas. Hoje mora no bairro de Santa Cecília (centro).
Leu, recentemente, o livro da pesquisadora Vavy Pacheco Borges e gostou. "O trabalho retrata bem o papai, um sujeito correto e cumpridor, mas também autoritário e pouco carinhoso. Foi por causa do espírito durão que semeou tantos inimigos."
O ex-administrador diz que o comandante "não tinha paciência com medrosos". Recorda-se de que, em 1931, cavalgavam juntos pelos morros do Pacaembu (zona noroeste de São Paulo).
"Eu acabara de completar 11 anos e, diante de uma ribanceira, estanquei. Não queria descê-la de jeito nenhum. Papai, irritado, me mandou seguir. Nem assim arredei pé. Ele, então, bateu nas ancas do meu cavalo, que deslizou pelo barranco e só parou lá embaixo."
Quando ressalta o caráter enérgico do pai, o filho não demonstra ressentimentos. "Quem dera se os jovens de hoje pudessem gozar da mesma educação que tive."
A disciplina espartana do coronel e seu amor às armas o colocavam, frequentemente, em situações dramáticas. Ney se lembra de pelo menos uma, que o livro da historiadora não aborda:
"Em julho de 1932, logo após estourar a revolução, Izilda, nossa irmã caçula, de apenas 2 anos, caiu doente e morreu, creio que de gastrenterite. Papai não estava por perto. Manteve-se de prontidão no quartel, esperando o embarque para o front."
Depois de conversar com a reportagem da Folha, Ney não se deixou fotografar. "É uma questão de princípio", explicou. "Não tenho o direito de usar a memória do papai para me promover."

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