São Paulo, segunda-feira, 1 de setembro de 1997
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Os culpados

NELSON DE SÁ
DA REPORTAGEM LOCAL

A morte veio aos poucos, na TV. Primeiro o acidente, nos plantões, depois a vigília de horas. Perto de uma da manhã, a Globo deu a morte, instantes antes da CNN.
A Globo News cobria sem parar. A Manchete copiava a CNN sem traduzir. Um turista americano, antes do anúncio, já dizia ter visto fotógrafos no local, momentos depois do acidente. A investigação já era criminal. E começou.
O irmão de Diana declarou que os editores todos, não só os fotógrafos, tinham sangue nas mãos. Na rua, um senhor discutiu com repórter.
Os próprios jornalistas: um editor inglês acusou à solta, sem isentar sequer a CNN, que especulava que Diana ia para a casa do "namorado". A rede mudou vocabulário e figurino, com ternos negros.
E seguiu o julgamento. "Os jornalistas mataram Diana?", dizia, sem forças, a CNN. Um editor de tablóide americano informou que os paparazzi envolvidos vendiam fotos do acidente por US$ 1 milhão.
Uma tentativa de reação foi feita pela rede mundial, que falou em "hipocrisia", pois os que acusam são os mesmos que demandavam cenas de Diana. A Globo ecoou o argumento.
Outras alternativas foram erguidas. A culpa seria da própria morta, que usava os jornalistas. Um editor inglês lembrou o príncipe, por não proteger Diana. Um repórter americano citou uma ouvinte, contra a amante de Charles. Um político inglês duvidou do hospital francês.
Na Rede Globo, Faustão agarrou-se à idéia de "dois tipos" de jornalismo -sendo o deles, presumivelmente, não-sensacionalista, e sem sangue nas mãos. Alguém lembrou a Mercedes, logo e estranhamente afastada com cenas de testes e elogios ao "carro extraordinário".
Domingo à noite, encerrado o caso. Julgado e condenado, o jornalismo matou Diana.

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