São Paulo, segunda-feira, 1 de setembro de 1997
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Dormir em vôo é a arte de rejeitar as extravagâncias

SILVIO CIOFFI
EDITOR DE TURISMO

Você entra no avião e toma alguns drinques antes mesmo daquele lauto jantar. Espera que o serviço de bordo termine e, então, vai ao banheiro. Depois se acomoda para dormir, certo?
Errado. Todo esse ritual faz o passageiro perder tempo precioso.
Apesar da falta de espaço -e até por causa dela-, o ideal é usar esse tempo no avião para dormir, ou mesmo descansar.
Só que dormir com um barulho desse, com carrinhos entupindo os corredores, requer habilidade.
Para revelar segredos do bem-estar nas alturas, Turismo conversou com médicos, pilotos e viajantes.
Um desses especialistas, o médico Josier Marques Vilar, 46, presidente da Sociedade Brasileira de Medicina Aeroespacial, explica que, em vôos longos, há uma alteração mais agressiva do ritmo biológico.
Para Vilar, nesses vôos transmeridionais, que atravessam fusos, o turista deve levar em conta que para cada fuso ultrapassado são necessárias 12 horas de adaptação.
Além disso, explica, "há o problema do deslocamento rápido e da pressurização, já que o interior dos grandes jatos tem nível de oxigênio menor do que o normal". Isso contribui para diminuir as capacidades digestiva e respiratória.
Segundo o médico, convém evitar comidas pesadas oito horas antes da viagem e bebidas alcoólicas ou gasosas durante o vôo.
Outra sugestão de Vilar diz respeito às pessoas obesas ou grandes que viajam em classe econômica. Elas devem fazer movimentos para cima e para baixo com os dedos dos pés e, assim, ativar a circulação.
"Remédios como indutores de sono e outros, só com receita médica", diz ele.
Fugir do "jet lag"
Já o comandante Marcus Prata, 40, que pilota os DC-10 da Varig em rotas para a Europa e os EUA, ressalta que, embora tripulantes e passageiros tenham visões diferentes, há procedimentos que servem para os dois quando o assunto é fugir do "jet lag" -a fadiga decorrente dos vôos mais longos.
Para Prata, o tripulante quase sempre faz retornos imediatos e, em 1 ou 2 dias de permanência no exterior, procura manter seu horário original.
Já os passageiros, que tentam a adaptação mais breve ao novo horário, precisam ter em mente que o fuso horário altera o ritmo das funções vitais e, para ele, gasta-se um dia para a adaptação de cada fuso horário ultrapassado.
Assim, quem vai à Europa, que nesta época está 5 horas adiante (ou 5 fusos), só se recupera plenamente em 5 dias.
Outra dica do comandante diz respeito às comidas leves, indicadas para antes e depois do vôo, quando também devem ser evitadas bebidas gasosas em excesso.
Se o tempo permitir, Prata diz que convém fazer caminhadas ao ar livre depois da viagem.
Manual do dorminhoco
Obsessivos por um bom sono podem testar algumas das dicas da seguinte coletânea heterodoxa:
1. beber alguns drinques pode ser, de fato, contraproducente. A pressão potencializa o efeito do álcool e torna o organismo mais suscetível. A melhor dica é beber água, que hidrata o corpo e preserva as funções vitais;
2. outra dica é alimentar-se com comidas leves antes do embarque. Por melhor que seja, a refeição de avião não é imperdível -e demora para ser servida, roubando horas de descanso do passageiro;
3. máscara de dormir, tapa-ouvidos e almofada inflável para pescoço (vendida nos free shops por cerca de US$ 10) são equipamentos valiosos. O pior é que, em geral, as companhias aéreas incluem esse kit básico apenas nos estojos das classes executiva e primeira, onde são menos úteis do que na classe econômica. Com a almofada inflável encaixada no pescoço, há mais posições confortáveis;
4. se você for levar bastante a sério a missão de dormir, aproveite para usar o banheiro (limpo) logo após a decolagem. Tome um copo de água quando o primeiro carrinho passar e cabule o jantar. Caso você esteja famélico, coma moderadamente o que for mais leve, evitando sucos e molhos ácidos;
5. como a movimentação é grande durante o serviço, prefira os assentos de janela, onde você corre menos risco de ser alvejado por uma bandeja. Na janela também há como encostar. Mas pese bem se você é do tipo que precisa ir muito ao banheiro. Nesse caso, você terá de saltar seu companheiro de fileira, ou importuná-lo;
6. viajantes frequentes fazem o check-in cedo e informam-se sobre os melhores assentos;
7. também é relativo que a classe executiva seja melhor para dormir do que a econômica. Isso vale para o avião cheio. Como o braço das poltronas de classe econômica levanta, se não houver ninguém do lado, dorme-se melhor em 2 poltronas do que em 1 da executiva, onde o braço não levanta.
Em três poltronas dorme-se como numa cama. A dica não vale para as novas poltronas da executiva, que são mais ergométricas. Na British Airways, a World Traveller é como um berço. Na Air France, a Espace 130 proporciona grande inclinação;
8. haja com rapidez e de forma discreta quando mudar de lugar procurando mais espaço para dormir. Até que o avião decole, você sempre pode ser desalojado;
9. se os travesseiros tiverem um plástico dentro da fronha, convém retirá-lo para evitar suadouro. Como a temperatura dentro do avião é fresca, evite usar muita roupa e cubra-se tanto quanto possível com um cobertor. Um travesseiro extra pode minorar o incômodo da fivela do cinto de segurança;
10. remédios para dar sono podem ser uma cilada. Com a excitação (normal) da viagem, eles podem até ter efeito contrário -estima-se que 5% das pessoas sofrem de efeito paradoxal a relaxantes ou estimulantes. Caso você esteja tomando algum medicamento, conserve a embalagem e a receita médica. Alguns remédios permitidos no Brasil são proibidos no exterior: na dúvida, consulte o médico;
11. há pessoas que contam a vida nos aviões. Além de chatas, elas roubam tempo precioso. Fuja do social se você quer descansar;
12. vista sapatos folgados e fáceis de calçar. Idem para roupas -quem viaja de gravata deve usar colarinho que não aperte;
13. certifique-se de que sua mala de mão tenha dimensões compatíveis com a dos maleiros do avião. Isso não significa que ela seja pequena. Existem malas de boas dimensões que cabem exatamente no porta-bagagens.
Escolha uma que tenha bolsos laterais e coloque neles um cadeado de segredo. Assim você pode colocar documentos e esvaziar os bolsos, o que ajuda na hora de dormir.
Não há nada pior do que moedas e chaves que caem dos bolsos. A mala de mão correta também facilita a evasão. E sair antes do avião significa pegar uma fila mais curta na imigração;
14. pese também se você prefere o vôo diurno ou o noturno. No diurno, se sua experiência como dorminhoco de avião for um fracasso, há sempre uma cama -de hotel ou a sua própria- na ponta da viagem. No vôo noturno, quando a necessidade de dormir é maior, a ansiedade do passageiro pode atrapalhar;
15. nos dias anteriores à viagem, é bom comer bem (mas sem excessos) e tomar vitamina C, evitando que o vôo acabe em resfriado;
16. durante o vôo, quando o avião já estiver "apagado", encontre alguns minutos para dar uma pequena caminhada e esticar. Algumas companhias, como a British Airways, ensinam pequenos exercícios que ativam a circulação;
17. aliado do passageiro no combate à ressaca do vôo, a piscina também ajuda na recuperação pronta do viajante mesmo antes do vôo. Fazer moderadamente alguma atividade física ajuda a alcançar o objetivo maior do dorminhoco, que é dormir;
18. hoje praticamente todas as companhias aéreas proíbem que os passageiros durmam no chão. Isso porque, num caso de despressurização, as máscaras de oxigênio ficam fora do alcance da mão.
Mesmo assim, deitar no chão foi a maneira que esportistas encontraram para dormir melhor. Algumas companhias têm um termo de responsabilidade, que o passageiro precisa assinar se decidir encarar o carpete. O risco existe.

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