São Paulo, terça-feira, 2 de setembro de 1997
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Secretaria precisa explicar o milagre do morango

WANDERLEY NEVES

No mundo inteiro, inúmeras organizações não-governamentais (ONGs) vêm lutando há décadas para eliminar a poluição causada por agrotóxicos e pela produção sadia de alimentos.
Há mais de seis anos, a Associação de Agricultura Orgânica (AAO) certifica agricultores que produzem, comprovadamente, alimentos sem a utilização de insumos químicos.
Mas somente no ano passado, a diretoria da AAO sentiu que havia condições técnicas para o lançamento do selo de garantia de qualidade.
Nesse contexto, causou surpresa à associação, e a tantas outras entidades que lutam pela qualidade ambiental, artigo do secretário da Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, Francisco Graziano, publicado no Agrofolha (15 de julho último).
Nesse artigo, foi anunciado que 300 produtores de morango da região de Atibaia-Jarinu, em São Paulo, receberam certificados da Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (Cati), que classifica sua produção como isenta de agrotóxicos.
Não há condições para reverter o modo de produção naquela região em tão pouco tempo.
Concordamos, porém, com os argumentos do secretário: "os agricultores precisam produzir, gerar empregos e renda no campo. Mas não podem contaminar o meio ambiente e ameaçar a saúde dos consumidores".
O mercado de morangos produzidos de forma convencional -com base em insumos e defensivos tóxicos- foi bastante abalado no ano passado.
Essa situação se deu como resultado de inúmeras denúncias sobre o alto grau de toxidade das frutas.
A reversão desse quadro exige ações enérgicas e urgentes, porém, com respeito ao consumidor, que deve ser informado da verdadeira qualidade do alimento que ingere.
O programa "Qualidade Cati" teria sido criado no início deste ano. Ou seja, em pouco mais de seis meses, teria acontecido um milagre na região: os solos foram descontaminados de resíduos tóxicos e toda uma sistemática de produção, acumulada por muitas gerações locais, foi substituída por outra ecologicamente correta.
A meta anunciada pela Secretaria da Agricultura é a eliminação dos agrotóxicos no processo de produção. Mas, nas entrelinhas, nota-se que o objetivo foi apenas o uso seguro de agrotóxicos, o que não acreditamos ser possível.
Esses produtos agridem o meio ambiente, a saúde do trabalhador que o manipula e leva resíduos à mesa do consumidor final, ameaçando sua saúde.
Seria necessário um trabalho gigantesco para transformar aqueles 300 agricultores em produtores de morango sem agrotóxicos.
Sem dúvida, isso é possível, mas demanda um tempo maior do que o anunciado.
Mais de 50 agricultores no Estado produzem de forma orgânica, sob a orientação técnica da AAO.
Para escoar essa produção, foram criadas cinco feiras de produtores e, com o lançamento de nosso selo de qualidade, muitos consumidores contam com a opção de encontrar esses produtos em supermercados de São Paulo.
Nossa preocupação é para com os consumidores dos produtos que recebem o selo de qualidade da Cati.
Como é feita a certificação desses produtores? Suas propriedades são vistoriadas? Seus métodos de produção são monitorados? Há um acompanhamento de todo processo produtivo? Quantos agrônomos, com especialização em produção agroecológica, estariam em campo se dedicando a esse trabalho? Como é feita a distribuição do selo de qualidade Cati?
A AAO deixa aqui registrada uma situação que cabe às entidades de defesa do consumidor esclarecer.

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