São Paulo, terça-feira, 2 de setembro de 1997
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Mercado tenta identificar piso para Bolsa

DA REPORTAGEM LOCAL

A crise das Bolsas de Valores é um fenômeno passageiro. Resta saber quando vai passar.
Essa perspectiva cautelosa, que contém esperança e advertência, é o ponto comum da análise de sete pesos-pesados do mercado financeiro ouvidos pela Folha.
Dois deles, Cláudio Lellis e Carlos Geraldo Langoni, arriscam falar em prazos. Para eles, este semestre será perdido para as Bolsas, depois da forte valorização das ações nos primeiros sete meses.
"Este ano acabou para as Bolsas", diz Lellis, vice-presidente do Banco Pontual. Ele não acredita em grandes altas ou baixas neste ano e acha que só em 1998 será definida nova tendência do mercado.
O movimento mais provável, em sua opinião, é uma queda suave seguida de estabilização, tanto no Brasil como no exterior.
Langoni, ex-presidente do Banco Central, vai na mesma linha. "Este semestre vai ser difícil para as Bolsas do mundo inteiro e, em particular, para as do Brasil."
Ele justifica sua previsão com o argumento da interligação dos mercados. Para compensar os prejuízos na Ásia, o investidor estrangeiro institucional precisa lançar mão de ativos em mercados de mais liquidez. "E o Brasil tem uma das Bolsas mais líquidas", diz.
Tamanhos de alavanca
Pedro Bodin, diretor de Operações de Risco do Banco Icatu, endossa a análise e identifica os dois ativos de grande liquidez do Brasil: ações da Telebrás e os C-Bonds.
Ele diz que muitos investidores estão olhando para o Brasil e se perguntando se aqui existe o mesmo problema que na Ásia.
Para Bodin, as duas situações são muito diferentes. No Brasil, o déficit em conta corrente é muito menor em termos relativos e a economia é muito menos alavancada, ou seja, há menos endividamento.
"Um dos problemas na Ásia é que as economias estavam muito alavancadas e o governo não podia elevar muito os juros. Na Tailândia, o crédito representava 150% do PIB", afirma.
No Brasil, compara ele, o crédito é equivalente a 30% do PIB. "E o investidor sabe que aqui o governo tem muito mais possibilidade de elevar os juros se alguém quiser testar a economia do país."
Ele considera natural a posição conservadora dos investidores em relação ao Brasil nesse momento, principalmente daqueles que perderam dinheiro na Ásia.
Quanto à queda das ações, volta ao livro de introdução dos investimentos. "Bolsa é chamada de renda variável e no semestre passado esquecemos disso."
Quanto ao futuro, Bodin vê nas quedas boas oportunidades de compra de papéis brasileiros.
Distância do chão
Francisco Gros, outro ex-presidente do Branco Central, acredita que o próprio mercado fará a correção que impedirá desvalorizações contínuas. "Quanto mais íngreme for a queda, mais rápido será encontrado um patamar", diz.
O presidente da Febraban, Roberto Setubal, está entre os mais otimistas. "O sistema financeiro brasileiro é o mais sólido entre os dos países emergentes", afirma.
Mas ele não descarta o "risco externo", que identifica na crise financeira asiática ou na eventual alta dos juros nos Estados Unidos.
Em caso de agravamento do cenário internacional, o governo poderia ser forçado a alterar sua política monetária, acompanhando o movimento dos juros mundiais.
Ele prefere, no entanto, não trabalhar com essa hipótese, que pressionaria o déficit em conta corrente. "O déficit não preocupa nos próximos três anos", afirma.
Paulo Ferraz, presidente do banco Bozano, Simonsen também acha que não há razão para preocupações. "É um maremoto e precisamos esperar a onda passar."
Para ele, a crise asiática não chega ao Brasil em parte devido à maior credibilidade do governo brasileiro, que vem demonstrando competência e já passou pela crise cambial do México.
Ele cita o nível das reservas brasileiras, acima de US$ 60 bilhões, e o modelo de câmbio, não totalmente livre, como empecilhos a ataques especulativos.
Ferraz não chega ao ponto, entretanto, de dizer que o país é imune a esses ataques.
Questão divina
Delfim Netto concorda. "Num mundo globalizado, essas crises se transmitem e nós estamos, de certa forma, sentindo esse efeito", afirma o deputado (PPB-SP) e ex-ministro da Fazenda.
Mas e a crise, é ou não passageira? "Só Deus poderia dar uma resposta, e Ele me falou que não se mete em Bolsa", desconversa.

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