São Paulo, terça-feira, 2 de setembro de 1997
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Diana, a princesinha da mídia

LUÍS NASSIF

Daqui a cem anos, quando se contar a história da indústria da comunicação de massa e do entretenimento, o caso lady Diana será exemplar. Não propriamente como vítima, mas como princesa de fato, legítima representante do novo poder que passou a dominar o mundo, da segunda metade do século em diante.
De fato, da Segunda Guerra para cá, os mecanismos de massa passaram a invadir quase todos os ramos da economia e da política, jogando para segundo plano os barões e potentados que dominavam a sociedade internacional.
No turismo, montou-se indústria sem paralelo, explorando o mercado popular. Graças aos ganhos de escala, a classe média passou a invadir todos os redutos antes destinados ao jet set. Os aeroportos internacionais foram tomados pelas novas classes afluentes, assim como os cassinos, os balneários.
Antes restritos à elite, os bens culturais popularizaram-se. Até os mercados financeiro e de capitais -espaços cativos dos grandes investidores- passaram a ser dominados por fundos de pensão prosaicos, como o das professoras da Califórnia.
Nesse novo ambiente, o caso Charles-Diana tem sentido figurado extremamente rico. Numa ponta, o herdeiro do último dos tronos relevantes. Na outra, a figura comum, embora belíssima, dona de casa real, oprimida, enganada.
É aí que surgem, imbatíveis, as hostes da mídia. A princesa expõe sua fragilidade e ganha a simpatia do público. Descobre que pode conquistar um cetro só seu -o de rainha do novo poder, da comunicação de massa- bastando, para tanto, valer-se de uma só arma: a exposição inteligente de sua intimidade.
Durante alguns anos, domina o cenário internacional com uma visão de marketing que só encontra paralelo em Jackie Onassis. Nada da vulgaridade de estrelas destrambelhadas, como Marilyn Monroe. Nem da exposição quase ingênua das princesinhas de Mônaco. Nem de longe o verdadeiro zelo pela privacidade, cultivado por estrelas maduras.
Rapidamente a princesa descobre que suas fraquezas constituem sua força. Mês após mês, começam a vazar para a imprensa casos, fotos, confissões, como se a princesinha real despisse um a um os véus da realeza falida, para assumir de vez seu cetro perante o novo poder.
O cetro perseguido pela princesa era tão mais relevante que o trono real, que o próprio marido, príncipe herdeiro da coroa britânica, sente-se desafiado a disputar a majestade em terreno plebeu. Abre o coração, e sai rotundamente derrotado pelas pernas, pelo charme, pela doçura atrevida da nova rainha da TV, dos jornais sensacionalistas e das revistas de "potins".
Seria tão simples evitar fotos em trajes esportivos, em maiôs, escolher melhor os amantes, recolher-se à verdadeira privacidade. Mas aí cessaria a fonte de poder da princesinha.
Longe de vítima da mídia -apesar da tragédia que a vitimou-, Diana foi sua rainha absoluta. Não teve sua vida destruída pela mídia, mas por um chauffer bêbado, e pelo charme desse jogo instigante de gato e rato, que ela sabia cultivar como poucos. Nem tão pouco teve sua privacidade arranhada um milímetro a mais do que ela mesmo planejou.
O que não atenua o caráter extremamente deletério que passou a dominar a mídia internacional. Tivesse a imprensa se pautado por valores mínimos, não se teriam destruído tantas vidas. E nem se teria construído a realeza plebéia da princesa Diana.

E-mail: lnassif@uol.com.br

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