São Paulo, terça-feira, 2 de setembro de 1997
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O BC e a corrupção

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - O presidente do Banco Central enviou-me respeitosa carta esclarecendo a venda do Bamerindus, objeto de suspeitas e de uma acusação formal por parte da revista "Veja" em número da semana passada.
Não sou exatamente um curioso desses assuntos, mas dentro da generalização do ofício -e livrando desde já o sr. Gustavo Franco de qualquer responsabilidade factual- constato que a corrupção existente, tanto no setor público como privado, teve e tem, na mais suave das hipóteses, a conivência ou a cumplicidade do Banco Central.
Lembro um caso da modesta biografia. Em 1980 precisei de autorização de um antecessor do sr. Franco para comprar US$ 10 mil no câmbio oficial. Detalhei os motivos profissionais: ia com o fotógrafo Antônio Rudge a Roma para embarcar no avião que traria o papa em sua primeira visita ao Brasil.
A rotina dessas viagens obriga o profissional a pagar ida e volta e foi o que fiz. Vim, mas não voltei, indo apenas o Rudge no avião que levava o papa de volta.
Meses depois recebi a intimação para explicar o que havia feito com os US$ 2.500 do bilhete de volta. Tive de apresentar um atestado da Sala de Stampa do Vaticano para provar que não viajara e que o dinheiro (como de praxe) não me fora devolvido.
Bem, se para míseros dólares de um pobre jornalista o rigor da investigação é tal e tanto, por que o mesmo rigor não impediu os rombos do Nacional, Econômico, os escândalos da era Collor/PC e outros que continuam por aí, dos quais só saberemos mais tarde?
Como guardião da moeda, o BC é seletivo. Usa de todo o rigor legal para os cidadãos comuns. Aporrinha e, se houver motivo, desgraça a vida de qualquer um. Mas historicamente costuma fechar os olhos quando se trata de esconder a corrupção graúda que só estoura quando há barbeiragem política dos interessados.

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