São Paulo, quarta-feira, 3 de setembro de 1997
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Paparazzi estão em cartaz no festival

LEON CAKOFF
ENVIADO ESPECIAL A VENEZA

A linha adotada este ano pelo 54º Festival de Veneza é claramente uma atitude contra o sistema. Veneza deixa de ser, ao menos por um ano, uma servil sucursal dos interesses de Hollywood e trata com mais reverência o cinema autoral.
Coincidentemente, num momento em que os paparazzi viram vilões reais, ganha mais realce o símbolo do festival deste ano com o seu cartaz em homenagem ao ator Marcello Mastroianni, que morreu em dezembro de 96.
A sua foto no cartaz é de "A Doce Vida", de Fellini, justamente o filme que criou o adjetivo para jornalistas/fotógrafos impertinentes.
O documentário "Wild Man Blues", de Barbara Kopple, sobre a turnê do clarinetista Woody Allen com seu grupo amador de jazz pela Europa, também trata do assunto.
As maiores críticas do filme são à imprensa fotográfica italiana e aos políticos locais, que tentam tirar proveito da proximidade com Woody Allen. A interferência do ator-músico é brilhante ao dar um basta nesses oportunistas que invadem o seu palco antes do concerto em Roma. Mesmo num documentário, Woody Allen não consegue deixar de atuar e criar piadas sobre a sua mitológica tendência paranóica. Um documentário que faz rir é o máximo do anticonvencional.
Kieslowski
Alguns dos melhores filmes da programação são dedicados (ou inspirados) ao polonês falecido Krysztof Kieslowski. O melhor de tudo vem do Canadá, em forma de vídeo.
São os seis episódios dedicados a suítes de Bach, com solos de violoncelos a cargo de Yo-Yo Ma. A produção destacada entre as seis é a dirigido por Atom Egoyan.
O episódio de Egoyan é "Sarabande", com a "Suíte nº 4", de Bach. Uma personagem é médica e também violoncelista. Ela é vista fazendo dueto com Yo-Yo Ma e atendendo a seus pacientes. Um deles tem câncer irreversível. É justamente o motorista que leva Yo-Yo Ma do aeroporto ao local do concerto.
É no trânsito engarrafado que Yo-Yo Ma e o chofer discorrem sobre a alma da música e falam com emoção inocente da função terapêutica da música.
A mão de Kieslowski também levita sobre o inspirado filme "História de Amor", do ator e diretor polonês Jerzy Stuhr. Ele foi ator de Kieslowski em seu primeiro e censurado filme, "A Cicatriz", esteve também em "Amador" e em "A Igualdade é Branca".
Jerzy Stuhr aparece no filme em cinco papéis diferentes. Em todos eles os personagens se dirigem a um mesmo edifício, como que para acertar as contas com Deus ou com o Diabo. Um é militar, outros são um professor universitário, um padre e um traficante preso.
Ao longo do filme eles têm suas chances de regeneração. O militar faz uma revisão de seu passado. Depois de haver servido para os russos, está aprendendo inglês e pensa seguir carreira na burocracia da Otan.
O professor, outra vez em nome da carreira, prefere continuar em solidão a receber o amor sincero de uma aluna. Militar e professor perdem assim a oportunidade de continuarem vivos.

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