São Paulo, domingo, 7 de setembro de 1997
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O RELÓGIO DA POBREZA

O desenvolvimento econômico no século 20 consagrou a fórmula: tempo é dinheiro. Na corrida por oportunidades, foram criadas novas tecnologias, produziu-se uma urbanização extraordinária, expandiram-se os mercados de consumo, ampliaram-se as opções de lazer e a economia global aparelhou-se para gerar e acumular excedentes numa dimensão sem precedentes.
Entretanto, nesse tempo acelerado de um progresso espantoso, outro relógio, perverso e igualmente cumulativo, nunca parou de funcionar: o relógio da pobreza.
Países emergentes tidos como exemplos de ajuste econômico, como o Chile, continuam produzindo estatísticas angustiantes. Na semana passada, para dar um exemplo próximo, o ministério do Planejamento chileno informou que um terço das crianças e adolescentes chilenos (1,3 milhão de pessoas) vive em condições de pobreza e tem poucas possibilidades de superá-las, pois seus pais pertencem aos 20% mais pobres da população. No Chile, economia que cresce e recebe capitais externos há pelo menos uma década, de modo quase contínuo, os 20% mais pobres recebem só 3,9% da renda nacional.
O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) chegou a criar um "relógio da pobreza" para ilustrar a rapidez com que o problema avança. O relógio mostra o aumento no número de pessoas que vivem com menos de um dólar por dia em todo o mundo, massa de 1,3 bilhão que cresce à taxa impressionante de 25 milhões por ano.
Há 150 anos o Ocidente passou por uma cruzada contra a escravidão. Houve progressos, é claro, mas hoje se recoloca uma luta análoga contra a pobreza. Esta aumenta tão ou mais rapidamente que a própria globalização, que por sua vez acumula excedentes de riqueza concentrada.
A redistribuição dos excedentes, a maior exigência política já no fim do século 19, continua sem resposta, apesar de todo o glamour com que se anuncia o capitalismo do século 21.

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