São Paulo, quarta-feira, 10 de setembro de 1997
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Novas oportunidades, novos desafios

ANTONIO BARROS DE CASTRO

Na segunda metade dos anos 80, enquanto a economia brasileira se retorcia em meio a uma hiperinflação reprimida, um novo paradigma gerencial e tecnológico difundia-se pelo mundo. Acompanhado de uma crescente abertura das economias, da emergência da China e de uma nova geração de tigres asiáticos, o novo paradigma acarretava um enorme acirramento da competição. Não se tratava, contudo, de mera intensificação das disputas por mercado. Estaríamos diante de uma "nova competição" onde, nas palavras de um autor da época, as vantagens comparativas são "criadas, dinâmicas e cambiantes".
Ou seja, enquanto na velha competição o custo da mão-de-obra e a abundância de recursos naturais tinham uma decisiva influência, a nova competição trazia consigo outras exigências. Permanente atualização tecnológica, alta qualificação dos trabalhadores, muita pesquisa e desenvolvimento e outros fatores ditos não convencionais passavam a ser necessários. A criatividade das empresas, convertidas em verdadeiros laboratórios, tornava-se fator fundamental. Em tais condições, de pouco ou nada valeria dispor de fatores tradicionais (mão-de-obra barata, recursos naturais abundantes). A competitividade fundada nesse tipo de vantagem não seria capaz de se sustentar. A isso costumava acrescentar-se que vantagens decorrentes de benefícios fiscais, créditos subsidiados etc. tampouco seriam sustentáveis.
Encontramo-nos hoje muitos passos adiante na transição para um novo mundo econômico e vai ficando claro que algumas dessas conclusões devem ser revistas.
A idéia de que no novo paradigma não haveria espaço para as vantagens associadas a recursos naturais revelou-se, no mínimo, parcialmente equivocada. Avanços em diversas áreas permitem hoje que a agricultura chegue à Chapada dos Guimarães e à dos Parecís, detonando vigorosos ciclos de crescimento onde há poucos anos nada havia. Algo análogo poderia ser dito acerca da exploração de petróleo em águas profundas. Em ambos os casos, recursos naturais praticamente ignorados até recentemente despontam hoje como autênticas fronteiras de crescimento.
A pouca relevância da mão-de-obra barata é outro equívoco. De fato, a combinação de novas técnicas de gerenciamento (auxiliada por novas tecnologias de informação) com novas formas de controle de mercado veio revalorizar a mão-de-obra barata. O fenômeno Nike é aqui uma boa referência. No caso, a mão-de-obra barata vem explicando sucessivas migrações de fábricas de áreas deprimidas da Inglaterra para a Coréia e Taiwan, a seguir para a Indonésia e hoje possivelmente para a Índia e o Vietnã. Quanto à matriz americana, não produz um só tênis. No Brasil, fenômeno análogo pode ser ilustrado por meio da empresa Grandene com sua base em Farroupilha e suas unidades de produção no Nordeste.
Com os capitais voando de um lado para o outro (refiro-me ao capital produtivo), os favores fiscais e creditícios vieram a adquirir enorme relevância. Ou seja, aqui também a nova competição, curiosamente, reabilitou instrumentos até muito recentemente tidos como ultrapassados.
O que acaba de ser dito significa que as apreensões diante da chegada da nova competição estavam simplesmente erradas? Sim e não. Sim, no sentido de que novas oportunidades, que não eram nem sequer vislumbradas, vão surgindo. Não, em dois sentidos.
As posições centradas em recursos naturais recentemente tornados acessíveis e, sobretudo, aquelas fundadas em mão-de-obra barata não habilitam os seus praticantes a competir com os desenvolvidos. Equivalem, em regra, a aceitar a permanência em campeonatos de segunda e terceira divisões.
As novas oportunidades ocultam uma brutal concentração de renda. Segundo consta, os 13 membros do Conselho de Administração da Nike (nos Estados Unidos) recebem aproximadamente duas vezes o total de salários pagos aos trabalhadores (6.500) da fábrica de Tangerang, na Indonésia.
Nada disso significa que não valha a pena explorar as novas oportunidades. Mas há que se indagar desde já como seria possível -nas novas condições- disputar, também, campeonatos de primeira divisão.

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