São Paulo, sexta-feira, 12 de setembro de 1997
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A regulação dos serviços públicos

ADRIANO PIRES RODRIGUES

A crescente deterioração dos serviços prestados pelas empresas estatais, somada ao aprofundamento dos desequilíbrios financeiros do Estado, levou um grande número de países a ingressar em programas de privatização. Nesse sentido, a opção pela privatização deve ser analisada enfatizando dois aspectos básicos: a necessidade de aumento da eficiência econômica e a do resgate das finanças do setor público.
No tocante à eficiência econômica, podemos distinguir entre eficiência produtiva e alocativa. O primeiro conceito refere-se à necessidade de adotar os mais eficientes métodos de produção e administração, de forma a produzir a custo mínimo. O segundo, por sua vez, aponta a capacidade de prover a sociedade com o nível ótimo de produção, o qual, por definição, é encontrado quando o preço se iguala ao custo de produzir uma unidade adicional do produto, o chamado custo marginal.
A privatização visaria incrementar a eficiência produtiva, na medida em que promove as seguintes mudanças: menor ingerência governamental dentro do ambiente da firma, balizando uma maior racionalidade econômica na utilização dos recursos; redução da lacuna existente entre a figura do proprietário e a do administrador, incrementando os incentivos para uma gerência alinhada com os objetivos de aumento dos lucros; por fim, eliminação do aval financeiro do Estado coerentemente com a disciplina do mercado de capitais.
Do lado da eficiência alocativa, a privatização seria utilizada com a finalidade de desatar os laços legais que afastam as empresas estatais do saudável ambiente da livre concorrência. Apesar da possibilidade de desvios da estratégia de maximização dos lucros, quando o controle e a propriedade da empresa privada estão em mãos distintas -sociedade de capital aberto-, é possível afirmar que a privatização conduz a uma melhoria da eficiência produtiva.
A privatização dos serviços públicos tem sido bem-sucedida no mundo inteiro. Telecomunicações, energia elétrica, gás, rodovias e ferrovias, petróleo, abastecimento de água e aeroportos são operados pela iniciativa privada no mundo inteiro.
No Brasil, são notórios os exemplos, entre outros, das privatizações da CSN, Usiminas e Cosipa e das concessões para exploração de rodovias, ferrovias e energia elétrica. Todavia, considerando a questão da concorrência, alguns pontos devem ser evidenciados antes de iniciarmos a privatização, para torná-la um meio capaz de impulsionar a competição.
Cabe ressaltar que, em algumas ocasiões, o Estado intervém no ambiente econômico com o objetivo de suprimir os efeitos nefastos da existência de monopólios ou oligopólios. Resumidamente, entendem-se como efeitos nefastos os casos em que as forças de mercado não levariam a um nível ótimo de produção, determinado segundo os critérios do bem-estar do consumidor. Nesse momento, o Estado entra em cena, para assegurar que o ótimo privado se aproxime do socialmente desejado.
Dessa forma, em setores monopólicos a saída do Estado, sem nenhuma salvaguarda, poderia mostrar-se prejudicial do ponto de vista do consumidor. Nesse sentido, o critério para implementação de um programa de privatização que vise a eficiência econômica deve reger-se pela confrontação de dois elementos fundamentais: a indispensabilidade e os benefícios decorrentes do aprimoramento dos incentivos para uma melhor performance interna das empresas.
As ineficiências resultantes dos serviços monopolizados ou cartelizados, principalmente aquelas relacionadas à estrutura de mercado, deveriam ser mais do que compensadas com incrementos na eficiência produtiva. Nesse contexto, haveria a necessidade de uma avaliação criteriosa do grau de substituição do bem/serviço e da eficácia da regulamentação diante das distorções resultantes de uma estrutura de mercado concentrada.
Tendo em vista a multiplicidade dos objetivos referendados no processo de privatização, deve-se ficar atento para a possibilidade da ocorrência de importante "trade-off" entre a eficiência produtiva e a alocativa. Desse modo, justifica-se a criação de um esquema regulador.
Cabe notar que, em muitas áreas nas quais predomina o monopólio público, a privatização deverá significar a queda de barreiras institucionais à entrada de outras fontes de produção. Todavia somente com um órgão regulador devidamente capacitado e atuante poderemos assegurar que outras barreiras à competição não substituirão os extintos obstáculos legais.
A opção pela privatização envolve, assim, um redirecionamento da intervenção do Estado na economia, com a ampliação do seu caráter normativo e regulador específico, essencial para a consecução dos objetivos inscritos no programa.
É preciso, no entanto, cuidar para que os órgãos de regulação de serviços públicos não asfixiem os concessionários, não signifiquem um aumento do poder do Estado e não sejam constituídos por pessoas que tripulavam as concessionárias estatais do mesmo setor.

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