São Paulo, sexta-feira, 12 de setembro de 1997 |
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Kubrick exerceu 'experiência não-verbal'
JESUS DE PAULA ASSIS
Sem ler, como entender o que se passa no final, quando o astronauta David Bowman envelhece de forma acelerada e se encontra com o misterioso monólito negro que aparecera na aurora do homem (primeira parte do filme)? Sem ver o longa, como apreender somente a partir do texto a solidão do espaço, o deserto em que se desloca a nave Discovery? Kubrick sabia disso e fez do filme, intencionalmente, o que definiu como "uma experiência não-verbal". De fato, as primeiras palavras pronunciadas na tela -"Aqui estamos"- aparecem depois de 30 minutos de silêncio. A verbalização está no livro. A solidão do espaço é o tema do filme. Kubrick contratou Arthur Clarke, além de comprar direitos de alguns de seus contos, para escrever o roteiro de "2001". Clarke e o diretor trabalhavam em conjunto, com Kubrick ditando para um gravador e Clarke preparando a partir disso um texto para posterior edição. O resultado é algo singular na longa carreira literária de Clarke. Seu estilo, de mais diálogos triviais, mais aventura do que caracterização de personagens e de situações, desaparece em "2001". Comparado com suas três pobres sequências -"2010", "2061" e, este ano, "3001"-, "2001" parece ter vindo das mãos de outro escritor. O livro (que seria mais próprio dizer de Clarke e Kubrick) mostra três etapas da evolução humana, dirigida por não se sabe que seres de outro mundo. Primeiro, dos primatas ao homem (passagem na qual o monólito tem o papel de ensinar aos primatas como fabricar instrumentos). Segundo, do homem moderno, do ano 2001, com o monólito que o engendrou. Na terceira parte, o homem, representado pelo solitário David Bowman, é elevado a uma nova etapa, tão distante do homem quanto este está dos primatas que o antecederam. Os finais da primeira e da terceira partes são simétricos: "Agora, ele era senhor do Universo e não estava bem certo de o que faria a seguir. Mas pensaria em alguma coisa". Os primatas pensaram em ser homens. O novo homem ("star child", no original) pensará em algo que o homem não poderia compreender. Filme: 2001 - Uma Odisséia no Espaço Produção: Inglaterra, 1968 Direção: Stanley Kubrick Com: Keir Dullea, Gary Lockwood Quando: a partir de hoje, no Espaço Unibanco de Cinema - sala 1 Texto Anterior: Coluna Joyce Pascowitch Próximo Texto: Trilha do filme tem dois Strauss Índice |
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