São Paulo, sexta-feira, 19 de setembro de 1997
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Da ficção para o chão

JANIO DE FREITAS
DA FICÇÃO PARA O CHÃO

Foi uma em cima da outra. Não há como restabelecer a ordem de incidência, nem teria maior utilidade conhecê-la, porque o acúmulo em um só dia (anteontem) é que traz à superfície, como a semente que germinasse na pedra, o esboço de um quadro que estava sendo escondido.
Já pela manhã, a representativa entrevista de Antonio Ermírio de Moraes, na Folha, com ressalvas à reeleição em que Fernando Henrique Cardoso se mostra tão confiante. Chega ao palácio, e mais tarde a rádios e TVs, a informação de que d. Luciano Mendes de Almeida criticou publicamente a possível reeleição de Fernando Henrique Cardoso, considerando que "uma renovação seria muito boa para o país".
Mais antecipações levadas pelos informantes palacianos: o FMI e Michel Camdessus reafirmam que o Plano Real e o Brasil estão correndo riscos graves; a Folha vai publicar (o que fez ontem) pesquisa mostrando que Fernando Henrique, se fosse agora a eleição, não escaparia de um segundo turno perigoso para suas ambições; e outra pesquisa indica que Ciro Gomes, projetando-se o apoio que obtém do terço do eleitorado que o conhece, revela potencial consistente para pôr em dúvida a reeleição de Fernando Henrique.
Mais ainda, a propósito do mesmo Ciro Gomes que eriça os palacianos: amanhã (foi ontem, já que falamos da quarta-feira) sairá uma entrevista de Ciro com críticas minuciosas e revelações incômodas para Fernando Henrique, à qual o "Jornal do Brasil" dará enorme destaque ("logo o 'Jornal do Brasil', que coisa" -terá dito alguém já quase como um suspiro, abalado pelo bombardeio).
Acrescente-se a chuvarada de críticas a Fernando Henrique procedentes do próprio PSDB e imagine-se a entrada, a toda hora, de alguém com uma dessas notícias e ainda com outros petardos. A irritação atribuída a Fernando Henrique foi mais uma gentileza que a reportagem lhe fez. O pontapé verbal dado por Sérgio Motta em dois senadores, que o procuraram no ministério, foi providencial para um safenado que, já posto em descontrole emocional pelos informes do dia, ainda seria questionado sobre uma greve incontrolável em sua área.
É o de menos que fatos assim não estivessem nos hábitos palacianos. Importa, sim, no acúmulo incomum e no forte significado de cada um tais fatos, que aí parece estar uma conquista inicial da voz pelo que está sufocado, por diferentes motivos. Se for assim -e vem mais por aí- é como sair do conto de fadas para a realidade -e nada pode ser melhor para quem queira um país adulto.
Salto olímpico
No adequado cenário do Copacabana Palace, grandes senhores da imprensa tupiniquim e senhores nem tão grandes ou não tão senhores, estão reunidos por um certo Freedom Forum e hoje trocam palestras sobre o papel da imprensa na transição da ditadura para a democracia na América Latina.
O tema é interessante e os palestrantes devem ser pessoas de brilho. Mas o programa insiste no atletismo desses fóruns que comentam a combinação de aspectos históricos e institucionais da imprensa latino-americana. Mais uma vez, vê-se um belo salto em distância.
Antes da transição houve a ditadura. E ainda está tudo por dizer sobre o papel da imprensa, com as TVs, na sustentação da ditadura, da qual, como instituição, foi alicerce e beneficiária.
Boa precaução
Quem supõe haver dissonância política entre o governador Tasso Jereissati e Ciro Gomes incorre, provavelmente, em erro que lhe compromete a análise do momento político e, talvez, da disputa sucessória mesma.

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