São Paulo, sexta-feira, 19 de setembro de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

As ações das telefônicas

WALTER ROTHENBURG

Quantas vezes você verificou que a administração pública voltou atrás em relação a uma decisão que havia tomado e que, supostamente, desconsiderava os interesses dos usuários?
Pois isso aconteceu com o sistema Telebrás. Os adquirentes de linhas telefônicas de planos de expansão assinaram um contrato em que pagaram pouco mais de R$ 1.000 às empresas estatais do setor, em troca da instalação futura da linha e da entrega de ações.
Ocorre que as ações dessas estatais têm aumentado consideravelmente de valor. Isso fez a administração optar por não mais entregá-las, devolvendo o dinheiro desembolsado pelo adquirente.
Foi imediato o inconformismo generalizado. Foram levantadas questões sobre o descumprimento dos contratos, a qualificação dos adquirentes como consumidores, o direito de preferência dos acionistas das estatais, os especuladores que adquirem direitos sobre tais ações e suas supostas implicações na privatização etc.
Nem todas estão resolvidas. Ficou, todavia, uma clara impressão de que se pretendia evitar indevidamente que a valorização das ações beneficiasse adquirentes das linhas, na rara vez em que particulares aparentemente se deram bem em negócios com o "governo".
Merece ser ressaltado, contudo, um aspecto de relevância e promissor. A articulação das "instâncias organizadas" da sociedade civil (e do poder público) foi pronta e firme. Em São Paulo (e não só), destacou-se a atuação dos meios de comunicação, do Procon, do Ministério Público estadual e da Procuradoria da República.
Essa resistência/advertência teve o mérito de provocar um efeito prévio e dissuasivo: a Telebrás e suas coligadas, em sintonia com o Ministério das Comunicações, recuaram para avaliar a situação e se reorientaram -comportamento, lamentavelmente, não muito comum na triste experiência de desmandos administrativos do país.
No que toca à participação da Procuradoria da República como "agência institucional" (estatal), conseguiu-se uma articulação concertada e camarada com a administração pública federal direta e indireta, por um lado, e uma primeira proteção à posição dos usuários potenciais, por outro. Ofereceu-se à sociedade uma resposta em tempo atual e de cunho preventivo, em vez da crônica morosidade e da consequente atuação repressiva como única que resta.
E evitou-se (ao menos em parte considerável do problema) que a questão fosse levada ao Judiciário. Uma ligeira sensação de missão cumprida, que incentiva o resgate da imensa tarefa social que tem sempre estado diante de todos nós.

Walter Claudius Rothenburg, 31, procurador da República no Estado de São Paulo, é professor de direito constitucional, pós-graduado pela Universidade de Paris 2.

Texto Anterior: Segurança não terá mais verba
Próximo Texto: Leitor pede reparos em rede elétrica
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.