São Paulo, domingo, 21 de setembro de 1997
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Forasteiros pediam para pescar

MÁRIO MAGALHÃES
DO ENVIADO ESPECIAL A LETICIA

As pegadas de Che Guevara em Leticia (cidade mais ao sul da Colômbia) teriam sido apagadas se, já na década de 90, não fosse publicado o diário que ele escreveu na sua primeira viagem pela América Latina, com cartas em anexo.
O breve relato do torneio disputado na cidade foi publicado na Argentina, e um livro chegou à cidade colombiana. Mesmo assim, poucos recordam de Che.
"Guevara não era ninguém para o mundo quando passou por aqui. Por isso, não há lembranças", diz o ex-jogador José Ramirez, 62.
"Vinha muita gente sem dinheiro, que se hospedava na polícia", conta o ex-centroavante Rodolfo Rodriguez, 76. "Guevara era como outros, não deixou marcas."
A primeira testemunha que a Folha encontrou não guardou um mínimo de simpatia por Ernesto Guevara e Alberto Granado.
"Eram dois pelaos (pobretões, duros) que vieram de San Pablo (Peru), dormiam na polícia e ficavam pedindo dinheiro, incomodando", disse, irritado, o comerciante Carlos Cueva.
Ele tinha a maior loja da cidade, onde os amigos bateram para pedir ajuda. Com o tempo, a transformação de Guevara no revolucionário Che aprofundou a antipatia. A principal testemunha dos dias dos argentinos por lá é Héctor Rojas, que tinha 14 anos. Ele só relacionou o viajante de cabelo curto ao guerrilheiro cabeludo ao ler a carta de Che à mãe.
Todas as suas informações conferem com outros relatos.
"Eles estranharam a quantidade de índios (ticunas e huitotos) daqui. Viviam a conversar pela cidade, perguntando quando chegaria o avião para Bogotá -os vôos eram quinzenais."
"Mostravam tristeza pela demora e pediam para pescar. Nunca falaram de política."
Segundo Rojas, Guevara mostrava surpresa com a paz na cidade. Em 1948, havia começado o período chamado "la violencia".
Hoje, na floresta em torno de Leticia, há destacamentos da guerrilha comunista. Na época, por segurança, Che viajou com um revólver, que não usou.
(MM)

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