São Paulo, domingo, 21 de setembro de 1997
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O rei da corte

MARCELO MANSFIELD
ESPECIAL PARA A FOLHA

"Alô terra de Santa Cruz, aquele amplexo". Tradutor e intérprete para empresas como Atlantis e White Martins, Renato Corte Real já era casado e tinha dois filhos quando se apresentou em "Céu e Inferno", programa de calouros da antiga TV Paulista, das Organizações Victor Costa, em 1954. A característica do show era o fato de o ganhador ser levado para fora de cena por um anjo, enquanto o perdedor ficava trancafiado numa jaula.
Depois disso -e de sete anos de sucesso- recebeu um ultimato: ou pára com as aulas de inglês ou pára com o humor.
Como diria Hebe Camargo, a "cestinha de produtos Atlantis" perdia um intérprete, e o público ganhava um ídolo.
Depois de ter passado pela Tupi e seu "Grande Show União" aconteceu o sucesso, na Record. Como o submisso Epitáfio, o marido obediente da mulher Santinha, interpretada por Nair Bello, Renato Corte Real tinha de usar uma tampa de frigideira por debaixo do lenço de cabeça, para não se machucar de verdade nas tamancadas que levava da sua empolgada parceira de cena.
Lá pelo meio dos anos 60 juntou a família para "Papai Sabe Nada". Máximo Jacarandá, casado com Biloca (interpretada por sua esposa Bizu), pai de Confúcio (Ricardo Corte Real, o simpático apresentador do "Supermarket") e de Friedreich (Ju Corte Real, um dos atuais reis dos filmes publicitários), vivia às voltas com seus problemas domésticos e os de sua Fábrica de Chupetas Polegar. Lá, onde Durval de Souza sempre atendia o telefone com o jargão "Gerbal Pascoal, chefe de pessoal", e Adoniran Barbosa, como o ascensorista, levava a platéia às alturas.
Pelo programa passaram Pelé e os Six Side Rockers, que depois se tornaram famosos como Mutantes.
Num dia de gravação, desespero: faltou a atriz que fazia a empregada. Pois Corte Real foi até a platéia, e perguntou sem mais delongas, se uma das mulheres presentes faria o papel. Foi lá que ele achou a nova Elizabeth.
E lá vem professor Nepomuceno de Alcatrão e Melo e Sigismundo Fraude, duas de suas criações, que seus filhos, no final dos anos 80, recriaram no extinto "TV Mix", da TV Gazeta.
"Boa noite Brasil, bom dia Japão... como é que vai, Agnaldão", anunciava seu maior sucesso: "Corte Rayol Show", que coroou Agnaldo Rayol como o rei da voz em substituição a Francisco Alves, e que trazia a combinação perfeita entre a comédia e a música. Dá saudade.
Ricardo foi para a "Família Trapo", Ju foi para o exército e Renato foi para a Globo para o "Faça Humor Não Faça Guerra", "Satiricon". Depois decretou ócio absoluto e se enfurnou num sítio por três anos, voltando ao SBT por mais dois.
Renato Corte Real só perdeu o humor uma vez: quando perdeu a lucidez pouco antes de morrer aos 57 anos.
Se eu pudesse, perguntaria ao professor Nepomuceno de Alcatrão e Melo por que gente boa morre cedo?

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