São Paulo, sábado, 27 de setembro de 1997
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Participação nos lucros

ESTÊVÃO MALLET

"A legislação passou do regime de produção artesanal para o da grande indústria e o dos produtos feitos em série sem, no entanto, que a máquina tenha sido aperfeiçoada" (Ripert)
Reeditada 35 vezes desde 1994, a MP (medida provisória) sobre participação nos lucros ou resultados ainda suscita interessantes questões. A primeira consiste em saber se a distribuição de lucros é hoje obrigatória ou mero instrumento de gestão empresarial, facultativo para o empregador.
O direito dos trabalhadores à participação nos lucros acha-se assegurado na Constituição (art. 7º, inciso 11), e a MP nº 1.539 impõe negociação para efetivar esse direito. Logo, não é simples prerrogativa conferida ao empregador, mas verdadeira obrigação legal. Não havendo, todavia, sanção, fica a obrigação muito enfraquecida.
Outra questão importante diz respeito aos empregadores obrigados a distribuir lucros ou resultados. A MP exclui a pessoa física e, observadas certas condições, as entidades sem fins lucrativos.
No tocante às empresas estatais, vinculou-se o benefício à edição de "diretrizes específicas... pelo Poder Executivo". Nenhuma das exceções se justifica. Ser o empregador pessoa física ou jurídica é aqui irrelevante, tanto mais quando a lei equipara a empresa individual à coletiva (art. 3º da CLT).
De outra parte, a Constituição cita lucros e resultados, evidenciando que mesmo empregadores não-voltados a atividades lucrativas podem ser demandados a distribuir ganhos com a melhoria da qualidade do produto ou serviço.
Finalmente, encontrando-se as empresas estatais sujeitas ao regime trabalhista das empresas privadas (art. 173), não podem beneficiar-se de diretrizes diferenciadas.
De todo modo, o caminho natural para o estabelecimento desse programa é a negociação.
Com quem há de negociar o empregador, no entanto? Na primeira edição da MP, a negociação deveria ser com o sindicato dos empregados; nas subsequentes, passou a ser com uma comissão de empregados; nas mais recentes, manteve-se a comissão, agora com um representante do sindicato.
Como, no entanto, a negociação em causa é necessariamente coletiva, somente o sindicato está habilitado a realizá-la (art. 8º, inciso 6º da Constituição).
Se, contudo, a negociação não chega a bom termo, o que fazer? A MP recomenda, nessa hipótese, o recurso à mediação e à arbitragem.
A solução oferecida, porém, mostra-se insatisfatória. Claro está que, se existe acordo relativamente ao árbitro ou mediador, nenhuma dificuldade se coloca. O problema surge justamente quando se deseja utilizar a arbitragem ou a mediação, mas não há acordo.
Pois bem, influenciada, ao que parece, pelo espírito do Conselheiro Acácio, a MP dispõe apenas que o mediador ou o árbitro "será escolhido de comum acordo entre as partes".
Melhor serviço prestaria a norma jurídica se oferecesse critério quando esse acordo não existe.
De todo modo, sempre resta a possibilidade de submeter a controvérsia à apreciação da Justiça do Trabalho, em dissídio coletivo.

Estevão Mallet, 29, advogado, é professor de direito do trabalho, mestre em direito do trabalho pela Faculdade de Direito da USP e membro da Academia Nacional de Direito do Trabalho. E-mail: Emallet@wm.com.br.

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