São Paulo, terça-feira, 30 de setembro de 1997
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JAZZ

CARLOS CALADO
ESPECIAL PARA A FOLHA

O disco de jazz mais vendido nos EUA, nos últimos dois meses, já está disponível no Brasil. "Swing", do quarteto vocal Manhattan Transfer, é uma das atrações de um pacote com 11 CDs, que a Warner acaba de importar.
O que mais surpreende no sucesso de "Swing" é o fato de ser um disco totalmente retrô. Com a classe e a qualidade musical de sempre, o Manhattan Transfer comemora 25 anos, com um resgate do jazz dos anos 30 e 40.
O quarteto criou deliciosos arranjos vocais para clássicos de "big bands", como as de Count Basie ("Topsy"), Chick Webb ("A-Tisket, A-Tasket") e Benny Goodman ("Stomp of King Porter"), sem esquecer o maior apelo desse gênero: a dança.
Clonagem
Também voltado para o passado, o primeiro álbum da cantora norte-americana Madeleine Peyroux, 23, não recende somente à nostalgia. Antes de tudo, "Dreamland" revela um surpreendente caso de clonagem musical.
Ao ouvir faixas como "Walkin' After Midnight" ou "Fun Out of Life", qualquer ouvinte desavisado vai acreditar que está escutando Billie Holiday (1915-1959), a grande "lady" do jazz.
O timbre vocal, a entonação e o fraseado de Madeleine são tão parecidos com o da Lady Day, que chegam a intrigar -uma semelhança que vai muito além da influência ou da imitação.
No entanto quando a garota se arrisca a cantar "La Vie en Rose" (a marca registrada da francesa Edith Piaf), o mistério desaparece junto com a lembrança de Billie.
Nem a companhia de ótimos jazzistas da nova geração, como James Carter (sax), Cyrus Chestnut (piano) e Regina Carter (violino) consegue salvar a incômoda sensação de falsidade deixada pelos vocais xerox de miss Peiroux.
A mesma Regina Carter aparece no pacote com disco próprio. Como se quisesse provar que pode tocar qualquer coisa com seu violino, ela se desdobra em diversos estilos: jazz-pop, acústico, jazz-funk ou até levadas latinas.
Nem tudo funciona tão bem como a sensível versão da balada "Soul Eyes" ou a sacolejante "Centro Habana", mas a musicalidade da violinista está acima de qualquer suspeita.
Uma boa surpresa do pacote é o CD de Henry Butler, um pianista cego de Nova Orleans, que tocou por aqui, no Bourbon Street, em 1995.
Não fosse a influência do professor Alvin Batiste, ele teria seguido a carreira de roqueiro.
"For All Seasons", quarto álbum de Butler, mostra um instrumentista completo, que empresta temperos do caldeirão musical de sua cidade até à jobiniana "Insensatez". Destaque também para o contrabaixo de Dave Holland.
O caminho do britânico Ginger Baker foi inverso. Começou tocando jazz tradicional, antes de se tornar um dos bateristas mais cultuados do rock, a partir de sua atuação no "power trio" Cream.
Nos anos 90, Baker reencontrou o jazz. "Falling Off the Roof" é a segunda experiência de seu inusitado -e às vezes estranho- trio com os vanguardistas Bill Frisell e Charlie Haden.
Pop
Fusões do jazz com o pop dominam o resto do pacote. É o caso dos CDs do pianista Bobby Lyle e do trompetista Rick Braun, que misturam funk e R&B a seus improvisos jazzísticos.
Já Harvey Mason prefere reproduzir, no CD "Ratamacue", a mesma "fusion" pasteurizada à moda de Los Angeles que ele já vinha cometendo na banda Fourplay, da qual é baterista.
Mas o pior vem mesmo com o CD de Boney James, outro líder recente das paradas de jazz, que persegue o muzak açucarado do abominável saxofonista Kenny G. Não se pode esquecer que qualidade e altas vendagens têm andado cada vez menos juntas no mercado.

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