São Paulo, segunda-feira, 28 de dezembro de 1998
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GATTACA

CECÍLIA SAYAD
DA REDAÇÃO

Mudam os parâmetros, mas a discriminação entre os homens permanece. Assim é o futuro retratado em "Gattaca - Experiência Genética", que sai agora em vídeo.
Sexo, raça e classe social não importam mais -os pais podem "programar" seus filhos, escolhendo cor de pele e cabelo e aptidões.
Assim que um bebê nasce, os médicos já podem saber a data e a causa de sua morte, o que predetermina o tipo de vida que levará.
A discriminação vai se basear, então, em dados genéticos que determinam fatores como doenças cardíacas, miopias etc., considerados aberrações que relegam os indivíduos à condição de "inválidos", destinados a trabalhos "menores", como limpar banheiros.
O que acontece com os bebês que não são programados, frutos de gravidez não planejada. Como Vincent (Ethan Hawke), que sonha em ser astronauta e até consegue frequentar o grande centro espacial Gattaca -como faxineiro.
Um dia ele descobre que há meios de driblar o sistema e assume a identidade de Jerome, um "válido" que sofreu um acidente e vive em cadeira de rodas. O acordo é o seguinte: Jerome fornece sua identidade a Vincent em troca de uma parte de seu salário.
Vincent carrega consigo amostras de sangue e urina de Jerome, os documentos utilizados no futuro. Ele é a prova de que os critérios que medem o potencial dos seres humanos não querem dizer nada: é tido como gênio.
Então, um dos diretores de Gattaca é assassinado e a polícia busca pistas. Encontrando um cílio de Vincent, não registrado -afinal, assumindo a identidade de Jerome ele não pode deixar vestígios de seu próprio corpo-, a polícia assume que ele é o assassino. O curioso é que o drama de Vincent consiste em esconder sua identidade, e não provar sua inocência.
Mesmo porque na sociedade retratada no filme não há espaço para questionamentos -um pouco como no futuro de "Admirável Mundo Novo" (1932), de Aldous Huxley, que previa uma organização social fundamentada em dados biológicos, "indiscutíveis".
Apesar de ressaltar a injustiça de sistema semelhante, o filme não chega a aproveitar o seu potencial crítico -que poderia inclusive servir para o mundo de hoje, em que não parece haver alternativa, por exemplo, para o modelo econômico dominante.
Isso porque a vitória de Vincent não ultrapassa o âmbito pessoal. Ainda que simbolize uma determinada classe, o personagem dá a suas conquistas um caráter individual, pois só prova o absurdo do sistema que o rodeia a si mesmo e a sua namorada (Uma Thurman).
O mundo de "Gattaca" continua sendo para poucos. Tanto que o sonho de Vincent não é transformá-lo, mas ir para Plutão.

Filme: Gattaca - Experiência Genética
Produção: EUA, 1997, 112 min
Direção: Andrew Niccol
Com: Ethan Hawke, Uma Thurman
Lançamento: Columbia (011/ 5503-9899)

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