São Paulo, sábado, 4 de abril de 1998
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Krugman teme 'crash' nos Estados Unidos

CELSO PINTO
DO CONSELHO EDITORIAL

O Japão está estagnado e sua Bolsa está despencando, enquanto os Estados Unidos continuam crescendo e com a Bolsa batendo sucessivos recordes. O economista Paul Krugman, contudo, está mais preocupado com a dimensão de uma crise potencial nos Estados Unidos do que com a crise real japonesa, comentou num café da manhã com alguns jornalistas, ontem, no Rio.
Krugman, um dos mais respeitados gurus do mercado internacional, acha que o Japão pode até sofrer uma recessão severa, como uma queda de 3% do PIB, mas é improvável que chegue a um "crash" com impacto mundial.
Já o "cenário pesadelo" para os Estados Unidos poderia incluir uma queda de 30% na Bolsa de Nova York e um salto do desemprego para dois dígitos, antes que o banco central (o Fed) pudesse reverter a situação. Ele não diz que isso vai, necessariamente, acontecer, mas não afasta a hipótese.
O grande risco nos Estados Unidos é que o que tem empurrado as Bolsas é a convicção de que o país "pode crescer 4% ao ano para sempre". Para Krugman, os EUA tiveram "dois anos excepcionais", mas o potencial de crescimento da economia, a longo prazo, continua entre 2% e 3% ao ano.
A economia americana tem crescido mais rápido do que isso nos últimos anos, sem pressionar a inflação e com desemprego muito baixo, ajudada por fatores únicos, segundo Krugman. Por exemplo, a redução no custo dos benefícios da saúde e dos preços de importação, em função da valorização do dólar.
Nos dois últimos meses, os ganhos salariais têm crescido a 5% ao ano, comparado a menos de 3% há dois anos. A produtividade da economia melhorou, mas nada espetacular: de 1,3% ao ano para 1,5%. O nível mínimo de desemprego aceitável sem que haja pressão inflacionária, que se supunha ser 6% há alguns anos, deve ser hoje de 5% a 5,5%, acima dos 4,6% atuais.
Em suma, Krugman discorda que a economia americana tenha passado por uma revolução que mudou seus parâmetros, como argumentam alguns economistas. Ao contrário, estaria dando sinais preocupantes de que pode voltar a acelerar a inflação.
O Fed sabe disso, diz ele, mas não eleva os juros por razões políticas, para não ser acusado de ter provocado uma recessão. Pode ser, contudo, que seja obrigado a elevá-los nos próximos meses.
Se esta subida coincidir com uma súbita percepção geral de que havia excesso de otimismo e que o crescimento não poderá continuar tão rápido, isso poderia provocar uma forte queda (talvez de 30%) na Bolsa. O Fed pode reagir devagar e cortar os juros só depois de a economia americana entrar num ciclo "japonês", de baixo crescimento.

Dilema japonês
O Japão, na visão de Krugman, está preso num círculo vicioso: cresce pouco porque há pouca demanda e a demanda é pequena porque a economia está crescendo pouco. Algo comparável ao que aconteceu nos anos 30 com a economia americana.
Qual a saída? Krugman recomenda uma gigantesca emissão monetária pelo governo, algo como US$ 1 trilhão, usado para recomprar dívida pública em mãos do setor privado. Reformas estruturais ajudam, mas é preciso mais do que isso.
Alguns dizem que uma emissão deste tamanho provocaria inflação; outros sustentam que seria inútil, pela tendência dos japoneses a poupar e não a consumir. Krugman diz que é impossível, logicamente, os dois argumentos estarem corretos.
Se nada for feito, a recessão pode se aprofundar. Não vai virar, contudo, um "crash". Para chegar a um crash, o governo japonês teria que reagir à piora do cenário de forma inteiramente passiva todo o tempo, o que ele acha improvável. Ao contrário de outros países asiáticos, onde existe uma fuga da moeda local em favor do dólar, no Japão isso não vai acontecer, o que abre sempre a possibilidade de o governo emitir para evitar o pior.
Os preços dos ativos japoneses podem cair ainda mais (inclusive o das ações). O risco de um contágio mundial muito forte, contudo, é pequeno. A Bolsa de Tóquio já perdeu 90% do seu valor em relação ao comportamento da Bolsa de Nova York, medido em dólares. Se isso não levou a nada dramático na economia internacional, por que uma queda adicional levaria?
Em relação à Ásia, Krugman está otimista com a Coréia e a Tailândia. Acha que ambos podem recuperar o vigor das exportações em um ano e voltar a crescer de forma significativa. Em outros países, a crise pode ainda piorar.

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