São Paulo, quarta-feira, 22 de abril de 1998
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Morre a principal opção política do PFL

JOSIAS DE SOUZA
SECRETÁRIO DE REDAÇÃO

Não morreu apenas Luís Eduardo Magalhães. Morreu com ele a principal alternativa política do PFL. Estava praticamente eleito para o governo da Bahia. Sonhava ser presidente da República.
Na última sexta-feira, a reportagem da Folha discou para o deputado, fonte obrigatória para entender o que se passava nos subterrâneos de Brasília. Travou-se, em um momento, o seguinte diálogo:
Folha - E então, o sr. já se considera governador?
Luís Eduardo - Não gosto de ser imodesto. Mas essa nem Mãe Menininha me toma.
Folha - E em 2002? Vai mesmo disputar a Presidência?
Luís Eduardo - Aí são outros 500. Minha bola de cristal não enxerga tão longe. Além disso, parece que o Fernando Henrique gostou da água do Alvorada. Se bobear, vai emendar um terceiro mandato. Não vê a movimentação do Menem? Deve ser boa essa fruta. Não digo que não tenho vontade de provar.
Voz e braço
Com a morte de Sérgio Motta, Fernando Henrique Cardoso já havia perdido sua voz mais fiel. Com a morte de Luís Eduardo, pouco mais de 24 horas depois, o presidente perdeu seu principal braço no Congresso.
Luís Eduardo era um apaixonado por esta Casa. O governo da Bahia seria sua primeira incursão pelos corredores do Executivo.
Ele se gabava de conhecer cada centímetro dos cerca de 180 mil metros quadros de área construída da Câmara e do Senado, algo como um Maracanã.
Quem entende de Legislativo sabe que há na Casa uns 20 deputados que mandam, cerca de 100 que carregam o piano, outros 80 que nem aparecem e o resto.
Luís Eduardo integrava o primeiro grupo. Estava entre os que davam as ordens. Frequentava qualquer lista dos homens mais influentes do país.
O deputado era, dentro do PFL, o sujeito em quem Fernando Henrique mais confiava. Poderia ter sido vice-presidente da República ou ministro de Estado. Convidado, não quis.
Com a saída de Luís Eduardo de cena, cresce a estrela de Jorge Bornhausen. Deve assumir a condição de interlocutor preferencial de FHC entre os pefelistas.
A troca é desvantajosa para o presidente. Primeiro porque não tem com ele a mesma intimidade. Depois, porque Bornhausen, sem mandato, não exerce sobre o PFL e sobre o Congresso um terço da influência de Luís Eduardo.
Poucas palavras
O forte de Luís Eduardo era a política urdida em reuniões a portas fechadas. Era uma raposa dos bastidores. Seu fraco era a aversão à atividade de "parlare", raiz da palavra Parlamento. Ele não era um tribuno.
Nem entrevistas gostava de dar. Preferia conversar com os jornalistas sob a proteção do anonimato. Como fez com a Folha no diálogo de sexta-feira.
Não há, mesmo no PFL, quem seja capaz de listar dez planos de Luís Eduardo. Os inimigos diziam que suas idéias eram desconhecidas porque o deputado não as tinha.
É irrefutável a importância do pai na carreira de Luís Eduardo. Seu primeiro emprego, aos 18 anos, foi justamente como oficial de gabinete de Antonio Carlos Magalhães, na época em que este governou a Bahia pela primeira vez, entre 71 e 75.
Mas é tolice imaginar que o deputado fosse um boneco nas mãos do pai. "O que eu faço com dor, ele faz sem dor", eis, nas palavras do próprio ACM, a principal diferença entre pai e filho.
Luís Eduardo tinha vôo próprio. Preferia o caminho da conciliação ao estilo "mata e esfola"cultivado pelo pai. Na relação entre FHC e ACM, funcionava como algodão em meio aos cristais.
Terceiro dos quatro filhos de ACM, foi o único da família a herdar o gosto pela política. Aos 26 anos, formou-se advogado pela Universidade Federal da Bahia. Jamais exerceu a profissão. Preferiu seguir as lições que tivera em sua própria casa, uma espécie de pré-escola da política.
O deputado dizia, entre amigos, que, na infância, sua casa era tomada por um interminável entra-e-sai de políticos. "Era impossível não pegar as manhas. A política tornou-se um vício para mim."
Antes de chegar a Brasília, foi deputado estadual por oito anos. Elegeu-se sempre com grandes votações. Logo em sua estréia, arrebanhou 180 mil votos.
Embora calouro, foi eleito por seus pares presidente da Assembléia. Ocupou o posto entre 83 e 85. Ao deixar a Casa, aos 32 anos, Luís Eduardo aposentou-se pela Caixa Parlamentar da Bahia. Anos depois, flagrado, abriu mão da pensão precoce.
Os eleitorado da Bahia o mandou para Brasília em 86. Desde então, vinha sendo reeleito. Em 94, foi o deputado mais votado da Bahia, com 138 mil votos.
Luís Eduardo tinha fama de cumpridor de acordos. Sob Fernando Collor de Mello, pagou caro pela manutenção da imagem. Nas reuniões internas do partido, desancava Collor. Chamava-o de ladrão. Em público, defendeu-o até o fim.
A mulher de Luís Eduardo, Michelle, insistiu. Seus médicos pediram. Mas o deputado, hipertenso, resistia à idéia de abandonar dois hábitos: o copo e o fumo.
Como sua mulher e seus três filhos ficavam em Salvador, Luís Eduardo era contumaz frequentador da noite brasiliense. Comia e bebia bem.
Gostava de vodca. Fez escala nos bons escoceses. Apertado pelos médicos, tentou vinho e champanhe, menos agressivos.
Há cerca de três semanas, porém, um dos médicos da Câmara queixava-se do paciente. Suspeitava que tivesse voltado à vodca. Pior: estava certo de que não havia nem mesmo moderado o cigarro.
Só uma recomendação seguia à risca: as caminhadas diárias.

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