São Paulo, domingo, 14 de junho de 1998
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A polêmica sobre a Telebrás

LUÍS NASSIF

O aprimoramento institucional do país tem de ser fundado em ampla discussão técnica e política com todos os setores da sociedade. É a única maneira de agregar visões distintas, aprimorar e consolidar o novo modelo institucional.
Quando a discussão se dá em cima de slogans, o país perde duas vezes. Primeiro, pelo tratamento fast-food a um tema que irá influir na vida de todos brasileiros. Segundo, pelo fato de não se agregarem visões críticas, capazes de aprimorar o processo.
É o que ocorre com essa discussão inicial sobre a privatização da Telebrás. A polêmica sobre o valor mínimo de privatização é inócua. Em qualquer transação econômica, só existe jogo de cartas marcadas quando o licitante pode definir previamente quem será o vencedor, restringindo a entrada de concorrentes.
Na privatização da Telebrás, aboliram-se todas as restrições ao capital estrangeiro ou a usuários do sistema. Introduziu-se -com atraso de anos, é verdade- a figura do assalariado, podendo participar com seu Fundo de Garantia de Tempo de Serviço (FGTS).
Havendo competição, os concorrentes pouco estarão se lixando para o preço mínimo fixado. Para eles, interessará os lances dos demais candidatos. Se houver um apenas que apresente um lance melhor, ele estará fora do jogo.
Por isso, se sentir que dispõe de vantagens comparativas melhores do que as premissas adotadas para a fixação do preço mínimo, o concorrente simplesmente irá incorporar essas vantagens no cálculo de preços e aumentar o seu lance, para não correr o risco de perder a batalha para um competidor.
Objetivos
Por isso, a discussão relevante é sobre dois itens específicos: quais as objetivos que se pretende com a privatização, e quais as condições técnicas da licitação, assim como o momento ideal para iniciar a venda.
Quanto aos objetivos, há uma série de pontos a considerar.
1) Maximização de preço; 2) objetivos sociais; 3) defesa do consumidor; 4) defesa da tecnologia nacional; 5) controle nacional.
Os quatro últimos são conflitantes com o primeiro. Ao definir objetivos sociais (levar telefone a setores que não interessam financeiramente à operadora) ou garantir o consumidor (definindo-se uma tarifa máxima por serviço), o Ministério das Comunicações incluiu novos elementos de custos, que serão descontados do que o comprador está disposto a pagar pela concessão.
O modelo proposto definiu como metas prioritárias a universalização do atendimento, a defesa do consumidor e, em parte, defesa da tecnologia nacional. Trocaram-se essas prioridades por uma redução no preço a receber, e eliminou-se a exigência de capital nacional.
Quem critica o preço deve definir claramente qual a alternativa que propõe: fim das obrigações de universalização? Fim do teto para a cobrança de tarifas? Eliminação da competição futura?
Momento adequado
O segundo tema de discussão é sobre a oportunidade de se privatizar agora, em uma situação pouco favorável no mercado internacional. Dois pontos devem ser considerados na análise sobre o adiamento:
1) o custo da rolagem da dívida interna cresce a 22% ao ano. Para compensar o adiamento, o preço da Telebrás deveria crescer outro tanto;
2) o custo que o adiamento representará para a economia como um todo.
A esse propósito, transcrevo correspondência enviada pelo leitor Marx Golgher: "Tenho um amigo, gerente de uma pizzaria, que tem tudo para abrir o seu próprio negócio no ramo, mas não pode fazê-lo por um simples motivo: no local que interessaria abrir sua firma não tem telefonia fixa. A Telemig, reconhecida como a melhor das teles do país, lhe confessou que só tem recursos para colocar o seu aparelho no próximo século, não se sabendo ao certo em que ano.
"Em medicina, considera-se dano ao paciente quando o médico retarda sem justificativa o tratamento, 'perdendo a oportunidade' da cura. Assim, não seria de bom senso considerar na avaliação das teles o custo da 'perda de oportunidades econômicas' quando negócios, serviços, industriais etc. deixam de ser instalados por falta de comunicação? Quanta riqueza e empregos deixam de ser criados?
"Pela fila de espera dos telefones, 10 milhões de infelizes pretendentes, o prejuízo pela perda de oportunidade para a nação não seria de alguns bilhões/ano, provavelmente a médio prazo, muito mais do que o valor venal da própria Telebrás?".

E-mail: lnassif@uol.com.br

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