São Paulo, domingo, 14 de junho de 1998
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Cresce a adoção de chinesas por americanos

ALESSANDRA BLANCO
DE NOVA YORK

A primeira vez que a jornalista Barbara Jones, 40, viu sua filha Maria, 4, ela chorava compulsivamente, mas não estava em uma sala de parto, como era de se esperar, e sim no corredor de um hotel em Hefei, uma cidade no sul da China, que é hoje uma das maiores "fornecedoras" de bebês para a adoção por norte-americanos.
Barbara foi uma dos 2.098 norte-americanos que adotaram meninas chinesas em 95. No ano passado, esse número já chegava a 3.637 nos Estados Unidos.
A onda de adoções começou depois que o Canal 7 de TV mostrou um documentário, há dois anos, em que meninas chinesas apareciam amarradas em berços de orfanatos na China, abandonadas por até 20 horas sem comer.
Para controlar sua superpopulação e também por tradição, em muitas cidades chinesas, as meninas são abandonadas logo após o nascimento. É que as famílias são encorajadas pelo governo a não ter mais que um filho, e diz a tradição que o filho homem deve sustentar os pais quando ficarem velhos.
Segundo a pediatra Jane Aronson, especializada no tratamento de crianças estrangeiras adotadas, ninguém sabe ao certo quantas meninas existem em orfanatos na China, mas calcula-se pelo menos 1 milhão. "Toda cidade, por menor que seja, tem um orfanato com cem crianças", conta.
O documentário mostrando as condições das meninas chinesas despertou o interesse dos norte-americanos, principalmente de mulheres solteiras, com mais de 35 anos, que vêem na China uma das poucas oportunidades que têm para ser mães, já que suas leis de adoção são bastante flexíveis e não há riscos de ter de devolver a criança aos pais biológicos, como tem ocorrido nos EUA.
O número de crianças chinesas adotadas nos EUA cresceu tanto que foi criada a associação Pais com Crianças da China, que faz reuniões mensais para trocar informações, discutir problemas e ter aulas de cultura chinesa.
As crianças são adotadas com uma média de 12 a 14 meses. Mas nem todas têm fácil adaptação à América. O choro de Maria ao encontrar Barbara é comum e costuma levar dias até cessar.
Essas crianças deixam a China com vários problemas de saúde (veja quadro nesta página), mas a maior dificuldade são as deficiências provocadas pela combinação de desnutrição e falta de atenção que resulta no retardamento do desenvolvimento.
A maioria das crianças, por exemplo, tem dificuldade de se movimentar. "Como não há aquecimento nos orfanatos, eles colocam os bebês enrolados, colados uns aos outros para se esquentarem, mas eles não conseguem se mover, nem ver seus próprios corpos. Quando ficam maiores, são colocados o dia todo sentados em cadeiras e presos com um cinto para que não caiam. Muitos têm marcas nos quadris e nos pulsos por causa disso", conta Aronson.
O desenvolvimento escolar também é de seis meses a um ano retardado em relação às outras crianças da mesma idade, principalmente no que diz respeito à língua. Como não foram estimuladas nos orfanatos, acabam não falando nem o inglês nem o chinês.

Texto Anterior: Indonésia tem partido chinês
Próximo Texto: 'Não queria ficar sozinha', diz mãe
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.