São Paulo, quarta-feira, 17 de junho de 1998
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Questão de confiança

PAULINHO DA VIOLA

A Copa de 98 reproduz um cenário já tradicional no futebol brasileiro. Como sempre, reunimos a maior quantidade de craques num só time, o que, normalmente, deveria nos tornar a seleção mais confiante da disputa. No entanto, a crise das seleções brasileiras -e a atual não foge à regra-, é geralmente de confiança. O torcedor brasileiro exige o título antes de começar o torneio e a pressão é tanta que os jogadores acabam reféns do medo de não corresponder à expectativa por exibições de gala.
É visível a melhora progressiva da seleção, à medida em que obtém os primeiros resultados e consegue relaxar a tensão. Ontem, especialmente, foi nítida a melhor qualidade do futebol apresentado no segundo tempo, quando o placar e a facilidade do jogo espantaram o medo de um mau resultado.
O torcedor brasileiro mais atento teve a chance de observar pela televisão, nas feições e no gestual de cada jogador brasileiro, no primeiro tempo, o medo de errar. Com os gols, esse medo foi cedendo espaço à confiança e o segundo tempo foi um outro jogo. Edmundo, que entrou no lugar de Bebeto, refletiu ostensivamente essa pressão: durante os 25 minutos em que esteve em campo foi sucessivamente driblado pela sua própria ansiedade em acertar.
Curioso é que ele substituiu o jogador que experimentara a mesma ansiedade no primeiro tempo e que, autor de um gol decisivo -o segundo-, começava a exibir um futebol livre do receio do erro.
Esse aspecto do futebol brasileiro, que faz de cada torcedor um algoz e de cada jogador um condenado por antecipação, me prende a atenção há algum tempo. Acho que o jogador brasileiro, se melhor compreendido pela sua torcida, renderia muito mais, desde o início, e até para o técnico a definição de um time titular seria mais fácil. O futebol brasileiro é leve, solto e criativo e, quando livre das pressões, torna-se irresistível.
Está bem claro que o time ainda não apresenta um padrão de jogo definido, à altura da qualidade do nosso futebol, mas penso que esse fato está diretamente ligado à cobrança exagerada que se faz aos jogadores e a todos os envolvidos no processo de preparação da seleção.
As chances do penta aumentam na proporção em que a tensão vai embora e o time sobe de produção. Acho que nosso comportamento como torcedores tem que subir também de padrão para dar aos jogadores a segurança emocional indispensável numa competição como esta.
Daqui do Brasil, minha maneira de torcer é estabelecendo uma ligação com o time, concentrando a memória nos personagens com os quais tenho uma proximidade maior. Fico pensando e torcendo por uma comissão técnica que, entre outros, tem uma figura maravilhosa como Paulo Paixão.

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