São Paulo, sexta-feira, 26 de junho de 1998
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Professor dá lições de tupi em livro

BRUNO GARCEZ
DA REPORTAGEM LOCAL

Os cariocas que apreciam se banhar nas águas da praia de Ipanema mal imaginam que estão mergulhando em um lago fedorento, um rio imprestável.
Não se trata de uma ofensa a um dos principais cartões-postais do Rio de Janeiro. A palavra Ipanema pode ter dois significados no idioma tupi: uruba (lago) + nem (fedorento) ou 'y (rio) + panem (imprestável).
Essa é uma das palavras cuja origem é explicada no livro "Método Moderno de Tupi Antigo", do professor Eduardo de Almeida Navarro, que será lançado hoje.
Navarro é, há cinco anos, professor de tupi antigo do curso de letras da USP (Universidade de São Paulo), a única cadeira na área existente no Brasil.
Assim que começou a dar aulas, ele percebeu que o material didático disponível no Brasil sobre o idioma tupi era muito escasso.
Foi então que o professor passou a criar apostilas para auxiliar seus alunos no aprendizado do idioma.
As apostilas acabaram servindo de base para o livro "Método Moderno de Tupi Antigo".
A obra apresenta 36 lições de tupi, contendo vocabulário, pronúncia, regras de fonologia e acentuação e exercícios práticos.
Para ilustrar as lições são usados diversos textos históricos, como a carta de Pero Vaz de Caminha, poemas escritos em tupi pelo padre jesuíta José de Anchieta e uma carta escrita em tupi por um dos participantes da Insurreição Pernambucana, movimento que aconteceu em 1645 em Pernambuco e que visava expulsar os holandeses do Brasil.
A carta foi encontrada pelo professor Eduardo Navarro na Biblioteca Real de Haya, na Holanda.
Língua geral
Segundo Eduardo Navarro, o tupi era o idioma mais falado no Brasil até a metade do século 18. Na época, o tupi era chamado de língua-geral.
"O português só foi se impor nacionalmente a partir de 1758, quando o marquês de Pombal expulsou os jesuítas do Brasil e proibiu o ensino de tupi nas escolas", diz Navarro.
O tupi era uma língua transmitida oralmente. Coube aos jesuítas a criação do registro escrito do idioma. No entender de Pombal, o uso do tupi vinha se configurando um instrumento de poder na mão dos jesuítas.
"A partir daí, o tupi entrou em declínio e o Brasil perdeu a oportunidade de ser uma nação bilíngue, como seus vizinhos Bolívia e Paraguai", diz Navarro.
A Bolívia é, na verdade, trilíngue, uma vez que, além do espanhol, tem dois outros idiomas oficiais: o quêchua e o aimará, ambos idiomas de origem indígena.
No Paraguai, o espanhol convive com o guarani, idioma parecido com o tupi. A semelhança, inclusive, já resultou em muitas confusões, conta o professor.
"Não é correto dizer tupi-guarani, uma vez que são idiomar distintos, mas com uma origem indígena comum. Estudos indicam que as diferenças entre os dois idiomas se acentuaram a partir dos séculos 12 e 13", afirma.
A toca dos fujões
Muitos termos correntes usados em nossa língua, além de nomes de locais, provêm do tupi.
O estádio Mário Filho, maior estádio de futebol do mundo, é mais conhecido por uma palavra de origem tupi, Maracanã. No original, "marakanã", nome de um pássaro.
No tupi, o "k" soa como o "q", e o "c" das palavras "querer", "casa" e "colo".
A expressão "nhenhenhém", usada para designar "resmungo" ou "falatório interminável", é uma corruptela do termo tupi "nhe'enga", que significa língua ou idioma.
Outro exemplo: os moradores do bairro Jabaquara, em São Paulo, são habitantes de uma toca de fujões. Explica-se: o nome do bairro se origina a partir dos termos "îababa" (fujão) e "kuâra" (toca). O local foi, no período colonial, um quilombo, onde se refugiavam escravos.

Livro: Método Moderno de Tupi Antigo
Autor: Eduardo de Almeida Navarro
Quanto: R$ 60 (622 págs.)
Onde: Centro Cultural Fiesp (av. Paulista, 1313, tel. 011/253-5877)
Patrocinador: Fiesp

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