São Paulo, sexta-feira, 26 de junho de 1998 |
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Passeata balzaquiana
LUIZ CAVERSAN Rio de Janeiro - Faz 30 anos hoje que ocorreu uma das manifestações populares mais emblemáticas da história do país e certamente a mais marcante do período em que o Brasil foi governado por militares: a Passeata dos Cem Mil.Até hoje não se sabe ao certo quem a fez ou como foi feita a conta para se concluir que essa quantidade imensa de pessoas foi às ruas naquele 1968, ano por si só tão cheio de emblemas. Mas o fato é que, durante seis horas, a multidão percorreu pontos tradicionais do centro do Rio -Cinelândia, avenida Rio Branco e Candelária- criticando o governo e pedindo liberdades, em apoio ao movimento de protesto engendrado pelos estudantes. Foi uma manifestação emocionada e sobretudo totalmente pacífica. Segundo o noticiário dos jornais do dia seguinte, tinha de tudo: os estudantes propriamente ditos, artistas, intelectuais, jornalistas, padres (foi daí que Nelson Rodrigues tirou a expressão "padre de passeata" para designar os religiosos ditos "progressistas") e populares em geral. Houve discursos radicais, mas a iconografia que estava na moda na época em todo o mundo (imagens e faixas saudando o líder vietnamita Ho Chi Min ou o revolucionário Che Guevara, por exemplo) esteve ausente. Segundo o relato do influente jornal "Correio da Manhã", esses símbolos "foram substituídas por algo mais expressivo para a inteligência política do governo: o veemente entusiasmo dos que, não tendo descido às ruas, aplaudiram do alto dos edifícios os manifestantes, emprestando-lhes decidida solidariedade". Mal sabiam aqueles 100 mil e tantos abnegados que a coisa ia ficar muito, muito mais feia, apesar de toda a euforia reinante. Diante do que aconteceu após a edição, em dezembro daquele mesmo ano, do Ato Institucional nº 5, tudo ali era festa. Talvez a Passeata dos Cem Mil tenha sido isso mesmo: uma grande festa antes do pesadelo dos chamados anos de chumbo, os anos da censura, das torturas, das mortes e do medo, que acabaram de vez com a redemocratização do país em 1985. Texto Anterior: O fator Itamar Próximo Texto: A lição Levitsky Índice |
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