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TEATRO
Dionisio Neto dirige seu primeiro clássico, uma peça do autor espanhol Federico García Lorca, na Casa do Eletricista
"Bernarda Alba" desponta à luz de vela
VALMIR SANTOS
DA REPORTAGEM LOCAL
"Cansei de falar da falta de comunicação", afirma o maranhense Dionisio Neto, 31.
O ator, diretor e dramaturgo
atravessou os últimos sete anos
mergulhado na linguagem multimídia, fragmentária e performática de espetáculos como "Perpétua" (1996), "Opus Profundum"
(1997) e "Antiga" (2001).
Agora, ele cai nas graças de Federico García Lorca (1898-1936), o
primeiro clássico que dirige, entre
paredes de uma tragédia familiar
que o poeta e dramaturgo espanhol escreveu no último ano de
vida, em plena Guerra Civil.
Neto vai a uma vila camponesa
do início do século 20 para identificar a corrente de comunicação
que envolve uma viúva e suas cinco filhas: "A Casa de Bernarda Alba". "São mulheres que vivem
uma a vida da outra", diz Neto,
sobre as moças enclausuradas pela mão-de-ferro de Bernarda Alba
(interpretada pela atriz Antônia
Tancredi, 61, em sua estréia profissional), entre criadas e a avó.
Alba impõe luto de oito anos
após a morte do patriarca, submetendo-as a pão, uva e bordado,
para dizer o mínimo.
Uma das filhas, Augusta (Augusta Ruiz), a mais velha, é noiva
de Pepe Romano. Esse homem do
qual se fala muito, corpo ausente,
mobilizará desejos reprimidos
em Martírio (Martha Nowill) e
Adela (Giovana Velasco), a caçula. A ortodoxia de Alba perpetuará o desfecho trágico.
Neto associa onipresença e tirania da matriarca à era de Bush filho, presidente dos EUA, cuja política belicosa, diz, desencadeou
onda internacional mais conservadora pós-11 de Setembro.
Sua Alba não esconderá sensualidade ou fragilidade demasiado
humana numa cena de banho,
única subversão ao clássico -ao
qual Neto pretende ser fiel.
A encenação de "Bernarda Alba" tem início no jardim, na recepção do espectador ao "velório", e adentra a Casa do Eletricista, ao lado da Casa das Caldeiras,
ambas construções antigas da família Matarazzo, num terreno da
Água Branca (zona oeste).
Para quem já fez uso de projeções em vídeo e música eletrônica, por vezes ao vivo (vide o conjunto Unidade Móvel na ópera-festa-manifesto-show "Opus Profundum"), o Dionisio Neto da vez
surge em "versão acústica", como
ele diz.
O "acústico" denotado pelo
canto coral das atrizes em várias
passagens; a percussão ao vivo,
realizada pelas próprias; a iluminação à vela nos cômodos do casarão (ironia para a Casa do Eletricista) e a proximidade com o
público, 30 pessoas por sessão.
Daí o tom intimista pretendido,
interpretação naturalista, à moda
do teórico russo Stanislavski
(1863-1938), busca de um "teatro
em estado bruto", diz Neto.
Ele vê as cenas como quadros
em preto-e-branco. Era assim que
Lorca concebia a peça, um "documento fotográfico".
A CASA DE BERNARDA ALBA - texto:
Frederico García Lorca. Direção: Dionisio
Neto. Tradução: cia. Satélite. Com: Isabel
de Sá, Jeyne Stakflett, Maria Manoela,
Odara Carvalho, Raquel Marinho, Laudo
Olavo. Direção de arte: Marcos Nasci.
Onde: Casa do Eletricista (av. Francisco
Matarazzo, 2.000, Água Branca, tel.
3873-6696). Quando: estréia hoje; sex. e
sáb., às 21h; dom., às 18h e 20h30.
Capacidade: 30 lugares. Quanto: R$ 20.
Até 21/12.
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