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ARTES PLÁSTICAS MOSTRA DO REDESCOBRIMENTO
A grande arte de Bia Lessa
BETTY MILAN
especial para a Folha
Você entra sem saber onde está
entrando. De repente, está no
meio de várias estátuas. Ouve um
canto estranho que é uma lamúria, que enreda, como na Odisséia, a voz da sereia.
Queira ou não você está longe,
desembarcou no país encantado
do barroco brasileiro.
Graças à varinha mágica de um
artista incomensurável. Uma baixinha imensa, Bia Lessa, que subverteu o conceito de museu.
A partir da Mostra do Redescobrimento, em exibição no parque
Ibirapuera, o museu -sob pena
de parecer arcaico- não pode
mais ser o lugar onde o público
vai olhar a obra de arte, considerá-la friamente.
Tornou-se o lugar onde o público vai para ser olhado pela obra,
ser por ela capturado ou com ela
dialogar. Num caso e no outro, ele
sai da trilha onde estava e se deixa
surpreender.
Bia Lessa fez com a escultura o
que Manet havia feito com a pintura no seu "Déjeuner sur I'Herbe".
A mulher nua do quadro do artista olha o espectador e faz dele
presa sua, é tão sujeito quanto objeto do olhar. Manet pintou-a
sentada na grama ao lado de dois
homens vestidos de terno e não,
como era de esperar, sozinha no
quarto.
Bia Lessa, como o pintor, tirou a
escultura barroca do lugar onde
ela habitualmente estava e a fez
ressurgir entre outras, brotar de
um canteiro roxo ou amarelo, um
canteiro da cor do ipê.
Com isso, deu à escultura a teatralidade que ela tinha e o museu
abafava. Deu-lhe vida...
Encanto
E fez mais, não pôs Aleijadinho
num lugar de destaque. Porque
neste lugar ela pôs o barroco inteiro, pôs a arte do Brasil que precisou dos 500 anos para mostrar
claramente a sua universalidade.
Bia teve a coragem de romper
com a tradição para revelar o passado.
Daqui por diante a referência de
todo museu efetivamente moderno será o teatro, e o Brasil será um
país de ponta para os museólogos
do mundo inteiro.
Só para ter produzido esta subversão o investimento na mostra
da Bienal já se justifica.
Só para que a geração futura já
não tenha que ir forçada ao museu, para que ela possa se encantar com a arte, amar o artista pela
sua ousadia.
Ou pela sua humanidade, ao
descobrir como eu que as flores
amarelas e as roxas da exposição
foram feitas pelos presos do Carandiru.
Betty Milan é escritora e psicanalista, autora de "O Papagaio e o Doutor" (Record), entre outros
Evento: Mostra do Redescobrimento
Quando: de terça-feira a sexta-feira, das
14h às 22h; sábado e domingo, das 9h às
22h
Onde: parque Ibirapuera (av. Pedro
Álvares Cabral, s/nº, tel. 574-0884)
Quanto: de R$ 7 a R$ 15
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