São Paulo, sábado, 03 de fevereiro de 2007

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Coreógrafo desmonta e recria bumba-meu-boi

Marcelo Evelin apresenta "Bull Dancing - Urro de Omi Boi" hoje no Sesc Ipiranga

Segunda parte de trilogia sobre identidade cultural do Nordeste, espetáculo estuda questões como desigualdade e violência


Darci Bastos/Divulgação
Cena de "Bull Dancing", que mistura teatro, dança e música


RAQUEL COZER
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Um bumba-meu-boi cosmopolita, uma trilha eletrônica de raiz. Se carece de sentido é porque Marcelo Evelin, 44, não é adepto da elucidação de seus intuitos. Em "Bull Dancing -Urro de Omi Boi", apresentado hoje no Sesc Ipiranga, o coreógrafo desmantela a tradição para recriá-la por um viés atual -e não tão fácil de digerir.
A peça de teatro e dança é uma volta às origens do piauiense, repatriado depois de 20 anos vivendo em Amsterdã.
"Bull Dancing" é a segunda parte do que ele define como uma trilogia da identidade nordestina. A primeira, "Sertão" (2003), nasceu de uma idéia singular: uma análise de seu corpo feita por um... topógrafo.
"No início, ele [o topógrafo] disse: "Não dá. Como assim topografia do corpo?" Mas acabou fazendo". E "Sertão" foi eleito o melhor espetáculo de dança de 2006 pela Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA).

Ressurreição
Para o novo trabalho, foi do corpo à alma em busca da essência do brasileiro. Do festejo popular, tomou a trama central: Pai Chico, empregado de uma fazenda, arranca a língua do boi preferido de seu senhor para satisfazer o desejo de sua mulher, grávida, Catirina, de comê-la. O animal morre e Pai Chico foge, mas curandeiros fazem o boi ressuscitar.
O coreógrafo localizou aí questões inerentes ao país: o boi como metáfora de desigualdade social e violência. "Vários pontos me interessavam: o desejo transgressor de Catirina, a dúvida de Chico entre praticar ou não o crime, a relação entre o sagrado e o profano. Ali, o homem é meio animal, e o boi simboliza os rituais de morte e ressurreição na vida de todo mundo".
Evelin alcançou um meio termo na trilha sonora, com toadas, batidas eletrônicas e arranjos eruditos. A miscigenação musical reflete outra mistura: no elenco de músicos/intérpretes, dividem o palco com o piauiense três conterrâneos, Josh S., Fabio Crazy da Silva e Sérgio Mattos, a eslovaca Monika Haasova e o mineiro Márber Ramos. A dramaturgia é da holandesa Loes van der Pligt.
"Bull Dancing" estreou em agosto em Teresina e causou estranhamento. "Meu boi é violento, político. O público conhecia a referência, mas não reconheceu o resultado. Alguns saíram dizendo que aquilo era uma agressão". Enquanto não se decide entre um pouso e outro -em Teresina, coordena o teatro João Paulo 2º; em Amsterdã, dá aulas em uma universidade-, Evelin pretende unir essas pontas na última etapa de sua trilogia. "Um olhar estrangeiro sobre a nossa cultura e o nosso olhar sobre esse ponto de vista."
A inspiração é a obra do pintor holandês Albert Eckhout (1610-1666), que veio ao Brasil com a frota de Maurício de Nassau (1604-1679). Quando fica pronto? "Não tão cedo. Eu mesmo ainda tenho muito a digerir sobre o "Bull Dancing"."

BULL DANCING - URRO DE OMI BOI
Quando:
hoje, às 21h
Onde: Sesc Ipiranga (r. Bom Pastor, 822, tel. 3340-2000)
Quanto: R$ 4 a R$ 12


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