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TEATRO/CRÍTICA
Peça sobre Coco Chanel se limita a representação de um mero desfile
SERGIO SALVIA COELHO
CRÍTICO DA FOLHA
O que uma atriz como Marília Pêra faz no meio de um
desfile de modas, em "Mademoiselle Chanel"? Claro, o desfile pode ser visto como uma metáfora: a
mítica Coco Chanel desfila sua vida na passarela, driblando com
sua grife a fofoca rasa.
Maria Adelaide Amaral traça
com sua habitual competência a
trajetória desta ex-cantora de cabaré que através da moda exigiu
respeito às mulheres livres, associando auto-estima ao despojamento. Ao fim do expediente de
sexta, para fugir da solidão, ela fala sem parar. A tendência ao didatismo faz com que acumule nomes e referências culturais que
honram a pesquisa, mas entravam a ação. A luxuosa produção
se esmera em projetar fotos num
telão, mas tudo se parece com
uma conferência em Power Point.
Uma atriz com menos experiência se deixaria engolir pelo espetáculo e pela fragmentação da narrativa. Mas Pêra impõe respeito
assim que surge, no alto de uma
escadaria cercada de espelhos, de
um gosto que é melhor não questionar. Dali para frente será um
duelo com sua imagem, que ela
vence com desenvoltura, preenchendo o desolamento branco do
cenário com uma partitura gestual vigorosa e precisa, como
quem esculpe gelo. Compõe a
personagem com uma técnica
primorosa, não decepcionando
quem vem para vê-la.
Porém, nem mesmo ela resiste
às sistemáticas interrupções para
pequenos desfiles, como se a
"maison" Chanel exigisse que o figurino roubasse o foco. As modelos-atrizes se esmeram nas poses,
mas isso soa como uma ingênua
caricatura da função de ator.
É injusto pensar que Pêra acredite que bons atores não precisem
de bons atores para contracenar.
Tendo o espelho como único parceiro à altura, alfineta a superficialidade de suas colegas de cena
para o deleite da cúmplice platéia
de senhoras de meia-idade, que
têm o cuidado de se apresentarem
também com seus chanéis. Assim, a peça se ofusca com esse
marketing superficial.
Com esse público no bolso, Pêra
poderia se arriscar mais, em espetáculos que exigissem mais de todos: afinal, a elite também precisa
ser formada enquanto platéia.
Mas a chave do espetáculo está
talvez no momento em que Chanel descreve o figurino luxuoso
que fez para uma peça de Cocteau, sem acreditar em seu talento
de dramaturgo: "Era para ser um
evento, não uma peça de teatro".
Pêra é uma grande atriz. Merece
muito mais que um evento. Mas
parece se contentar com isso.
Mademoiselle Chanel
Direção: Jorge Takla
Com: Marília Pêra e outros
Onde: teatro Faap (r. Alagoas, 903, tel.
3662-7233)
Quando: sex. (21h); sáb. (19h e 21h30);
dom. (18h). Até 31/10
Quanto: de R$ 65 a R$ 70
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