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São Paulo, terça-feira, 07 de outubro de 2003

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TEATRO

Cia. Os Primos recria a tragédia "Otelo", de Shakespeare, a partir dos arquétipos sugeridos pelo psicólogo Carl Jung

Peça vê o masculino através de Desdêmona

Lailson Santos/Divulgação
Kathia Bissoli (Desdêmona) e André Ferreira (Otelo) durante ensaio do espetáculo da cia. Os Primos que recria a tragédia de "Otelo"


VALMIR SANTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Ela é epicentro das atrocidades geradas por suspeita de ciúme, morre estrangulada nas mãos do marido, empresta seu nome ao título, mas quem dá as cartas na peça, e mal, são os homens.
Se você pensou em "Otelo", acertou. O espetáculo "Desdêmona", que estréia hoje no teatro Augusta, com a cia. Os Primos, é ancorado na tragédia do bardo inglês William Shakespeare (1564-1616), mas quer recriá-la segundo uma leitura simbólica do universo masculino proposta pelo psicólogo suíço Carl Gustav Jung (1875-1961).
Assim, o mouro Otelo (interpretado por André Ferreira), general a serviço de Veneza, corresponde ao arquétipo do rei.
Seu alferes, Iago (Fernando Oliveira), homem de confiança que maquina o veneno do ciúme, é o mago; o lugar-tenente Cássio (Fábio Ferretti), pobre coitado sobre o qual recai a suspeita de ser "o outro", claro, é o amante.
E Rodrigo (Ricardo Garcia Marques), que no Shakespeare original não é um militar, aqui engrossa o exército de Otelo e encarna a figura do guerreiro.
O rei espelharia autoridade, poder; o guerreiro seria passional, impulsivo; o amante, sensível; e o mago, aquele que dominaria a comunicação, um ilusionista.
Na dramaturgia de Gerson Steves, esses arquétipos podem compor a essência do indivíduo masculino, conforme Jung.
Tal qual uma espectadora, Desdêmona (Kathia Bissoli) testemunha in loco à construção da tragédia à qual ela mesma será submetida, traída pelo maquiavelismo de Iago e pela cegueira de Otelo, seu marido. Ao cabo, todos sucumbirão, sejam nobres ou vis.
"A mulher que desperta a energia masculina desses quatro homens é uma chave fundamental na tragédia, mas nunca tem papel de agente; aliás, como a história da maioria das mulheres ao longo dos séculos", afirma a diretora Fernanda Maia, 36.
Em cena, Desdêmona permanece muda; expressa-se apenas por meio da ação física. "A palavra é um poder de decisão ao qual ela não tem acesso", diz Maia.
Na montagem, o público se desloca de um espaço a outro, como da Veneza das razões à Chipre das emoções.
"Desdêmona" pode ser um complemento ao "Otelo" genuíno que cumpre temporada na sede do grupo Folias d'Arte.

DESDÊMONA. De: William Shakespeare. Dramaturgia: Gerson Steves. Direção: Fernanda Maia. Com: cia. Os Primos. Onde: teatro Augusta (r. Augusta, 943, Cerqueira César, tel: 3151-4141). Quando: estréia hoje; ter. e qua., às 21h; até 26/11. Quanto: R$ 12.


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