São Paulo, sábado, 10 de março de 2001

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TEATRO

"Aqui Aconteço", espetáculo que reúne 39 poemas e apresenta a vida conturbada da poeta, estréia hoje no CCSP

Orides Fontela sai dos livros para o palco

MARCELLA FRANCO
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Foi em incursões por prateleiras de poesia que Orides Fontela (1940-1998) deu seu primeiro passo em direção aos palcos. Incursões não suas, mas de dois atores que decidiram, depois de pesquisar sua obra, conduzir seus poemas dos livros ao teatro.
"Aqui Aconteço" é resultado do trabalho de Suia Legaspe e do diretor Ary França e estréia hoje no Centro Cultural São Paulo. Sozinha no palco, Suia representa a vida da poeta nascida em São João da Boa Vista (SP), que foi uma das mulheres mais polêmicas no meio acadêmico dos anos 70 e 80. Orides ganhou fama por seus desafetos, temperamento irascível e vida conturbada.
"Ela era muito difícil, não tinha habilidade no trato com os outros. Uma pessoa sem parâmetros e muitas vezes agressiva", conta Suia, referindo-se às brigas que a poeta despertou ao longo da vida e que lhe renderam o isolamento social em seus últimos anos.
Cercada de inimizades de um lado, Orides, no entanto, cobriu sua obra de admiração vinda de grandes nomes da literatura, entre eles, Davi Arrigucci Jr., responsável também pelo texto de abertura de "Aqui Aconteço".
"Quem conhece sua obra se apaixona", resume Suia. "É de uma qualidade altíssima, respeitada por pessoas como Antonio Candido e Augusto Massi."
Sobre a dificuldade de levar poesia ao teatro, o diretor Ary França não se intimida: "Não tenho medo. Apesar de saber que no Brasil lê-se pouca prosa e muito menos poesia, sei que há meios de tocar o público. Colocamos o foco no imaginário, para que a platéia seja estimulada e transforme-se em um "co-autor'".
O espetáculo reúne no palco 39 poemas da autora, desde suas produções mais longas até os haicais. "Separamos a obra dela por temas e a encenamos por meio de um fio condutor. Mas não é nada declamado, como aqueles espetáculos em que vem uma pessoa, diz o nome do poema e desata com os versos", explica Suia.
Passa-se pelas peças sacras -que lembram o budismo, religião seguida por Orides-, por aquelas que tratam da palavra, do cotidiano, pelas memórias e, para finalizar, faz-se uma volta ao sagrado. "Acredito que cada uma das fases dela tem seu valor", diz a atriz. "A que trata do dia-a-dia, por exemplo, é excepcional, por mostrar como Orides tinha dificuldade no contato com o real."
A poeta aprovaria a montagem? O diretor prefere não apostar em nenhuma reação. "Ela era imprevisível, ciclotímica. Pode ser que ficasse encantada, mas também poderia ir ao teatro e começar a bradar no meio da peça", diz França. "Melhor não arriscar."



Peça: Aqui Aconteço
Onde: Centro Cultural São Paulo (r. Vergueiro, 1.000, tel. 3277-3611)
Quando: sex. e sáb., às 21h30; dom., às 20h30. Até 8/4
Quanto: R$ 8




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