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MÚSICA
Roda reúne jovens talentos para tocar e falar de política; ingresso custa R$ 1 e ajuda a divulgar os participantes
Samba da Vela mostra novos compositores
MARCOS DÁVILA
FREE-LANCE PARA A FOLHA
"Um bom samba é uma forma
de oração." O verso de "Samba da
Bênção", de Vinicius de Moraes e
Baden Powell, resume bem o espírito do Samba da Vela, uma roda
que acontece toda segunda, religiosamente às 20h30, no bar Ziriguidum, em Santo Amaro.
"Um monte de gente em volta
de uma mesa, com uma vela acesa
no centro. Nas paredes, várias fotos de gente morta. Quem vem
aqui pela primeira vez pensa: "Xi é
macumba'", brinca o sambista
Magno Souza, 26, entre uma música e outra. Ele é um dos fundadores do Samba da Vela, ao lado
de seu irmão Maurílio de Oliveira,
22, e dos sambistas Chapinha, 41,
e Paquera, 42.
A roda surgiu com o objetivo de
apresentar sambas inéditos de
compositores da nova geração.
"A vela funciona como um relógio, antes a gente saía às três da
manhã. Agora, quando a vela apaga (geralmente por volta das
23h30) o samba acaba", diz Chapinha, que é um dos sócios do bar.
Noel Rosa, Pixinguinha, Cartola, Nelson Cavaquinho são alguns
dos "mortos das fotos" que, ao lado de outros vivos, como Paulinho da Viola, vigiam da parede o
Samba da Vela. "Os quadros significam o respeito que a gente tem
pelos grandes mestres", explica
Magno. A impressão que se tem é
de estar em uma quadra de ensaio
de escola de samba, tamanho despojamento do lugar, um grande
galpão com um barzinho ao fundo, onde são servidas as bebidas.
Sobre o balcão, lê-se: "Aqui o Silêncio é uma Prece".
O que começou como uma reunião de amigos, com o tempo, tomou outra proporção. No aniversário do evento (dia 16 de julho
deste ano), que teve a participação especial da cantora Beth Carvalho, mais de mil pessoas lotaram o lugar. Segundo os fundadores, a sambista ajudou muito na
popularização da roda, que recebe normalmente cerca de 200 pessoas por noite. "Ela é a madrinha
do Samba da Vela", diz Magno.
"A conotação política da roda
também é muito forte", diz Tiago
Mendonça, 23, frequentador assíduo do local, que está produzindo
um documentário sobre o projeto
com o cineasta André Francioli,
27. "Resolvemos registrar esse
movimento do samba político
que está se estruturando", diz
Mendonça. "No intervalo das
músicas, são discutidos temas da
comunidade."
Além de falar de amor, grande
parte das letras são crônicas urbanas, falam da comunidade com
muita ironia e crítica social, como
em "Samba da Isabel" ("Coitada
da Isabel foi assaltada/ segunda-feira de madrugada/Levaram os
discos de samba que ela tinha/Ataulfo, Noel Rosa e Pixinguinha/
Seu ladrão devolva tudo por favor/que nós cantaremos ao vivo
pro senhor"), de Vanderlei Mazzucatto; e "Fim da Orgia" ("Sem
essa de barraco lá no morro/Não
quero ser cozinheira/de forno e
fogão, lavar e passar..."), de Pachequinho, sobre a situação da
mulher na periferia.
As músicas são acompanhadas
por três cavaquinhos, dois pandeiros, um repique de anel, dois
tamborins, um reco-reco de madeira e um surdo. "Os instrumentos não são tão importantes, o que
vale é o canto e as palmas", diz
Magno, que toca no Quinteto em
Branco e Preto com Maurílio.
É cobrado R$ 1 na entrada do
bar para ajudar na publicação
mensal de livretos com as letras
dos sambas cantados na roda, distribuídos entre a comunidade.
Quando o samba acaba, é servida
uma macarronada ou uma sopa
preparada pelo "chef" Oliveira.
SAMBA DA VELA - Quando: segundas,
às 20h30. Onde: bar Ziriguidum (r.
Antônio Bento, 257, Santo Amaro, tel.
5522-4169). Quanto: R$ 1 (com direito a
macarronada ou sopa no final).
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