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"HÉCUBA"
Esther Goés divide a direção com o filho, Ariel Borghi, e interpreta o papel principal em tragédia de Eurípides
Centralização de funções compromete peça
SERGIO SALVIA COELHO
CRÍTICO DA FOLHA
Não é fácil encenar tragédia
grega. Na raiz do teatro do
Ocidente, mas ainda próxima do
ritual, tem suas regras próprias
para as quais as técnicas do realismo são de pouca ajuda. Assim,
para as peças de Eurípides, a solução é ora "modernizar" o texto
para revitalizar os seus conteúdos
-e há vários espetáculos em cartaz em São Paulo que seguem a estratégia-, ora fazer da montagem um exercício técnico que leve
os atores a declamarem e ostentarem hierarquicamente a dor sem
perderem a solenidade nem a empatia no palco.
Foi o que escolheu Esther Góes
para esta Hécuba, o que é totalmente adequado para uma montagem de conclusão de curso. Não
se pode formar atores na inovação; é preciso antes que se interiorize as regras convencionais. Era
isso que fazia o Teatro Brasileiro
de Comédia 50 anos atrás, quando foi vencido o tabu de encenar
tragédia no Brasil; é isso que se faz
nos conservatórios dos grandes
centros de cultura.
Com um mérito pedagógico inquestionável, a partir do momento em que o exercício se apresenta
enquanto montagem comercial, é
preciso que seja analisada sem paternalismo, em respeito pela seriedade da proposta. E nesse ponto, infelizmente, muitas ressalvas
devem ser feitas.
Esther Goés é uma atriz com
grandes recursos, à altura do papel de Hécuba. Seu belo timbre de
voz vai do sussurro ao grito sem
perder a emoção e tem uma leitura aprofundada dos objetivos da
peça. Precisa, no entanto, de um
diretor em quem confie, para canalizar sua grande energia.
Acumulando funções, centra
em demasia o espetáculo em sua
performance e, logo nos primeiros momentos, já vocifera e se
lança no palco, contracenando
pouco com seus parceiros-alunos. Seu filho, Ariel Borghi, na co-direção do espetáculo, não teve
pulso para contê-la, e o espetáculo
logo se torna excessivo.
A inexperiência do elenco se denuncia pela aplicação com que
declamam, "mastigando" a bela
tradução de Mário da Gama
Kury, mas visivelmente intimidados pela tarefa. Essa tensão limita,
por exemplo, a boa presença de
Erika Altimeyer no papel de Polixena e, se o elenco feminino cumpre com elegância a partitura gestual do coro, o masculino deixa
muito a desejar, chegando ao
constrangedor, quando Polimestor é cegado.
A impressão de amadorismo é
reforçada pelo cenário e figurino,
que, a partir de poucos recursos,
ganharia com um maior despojamento. A trilha sonora acrescenta
ainda mais grandiloqüência ao
clima, de modo redundante, que
quase cai na paródia. Não ajuda
em nada o estado de abandono da
sala Gil Vicente do teatro Ruth Escobar, com numeração confusa e
cheirando a mofo. Cheia de boas
intenções, corajosa ao enfrentar
duros desafios, esta montagem de
"Hécuba", no entanto, acaba
soando pretensiosa.
Hécuba
Texto: Eurípides
Direção: Esther Góes e Ariel Borghi
Com: Esther Góes, Fagner Pavan, Elder
Fraga, Calil Jabur e outros
Onde: teatro Ruth Escobar - sala Gil
Vicente (r. dos Ingleses, 209, Morro dos
Ingleses, região central, tel. 3289-2358)
Quando: de qui. a sáb., às 21h, e dom., às
20h; até 28/11
Quanto: R$ 30 (R$ 10 nos postos da
Apetesp, a partir de amanhã)
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