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TEATRO
"Os Jogadores", texto do dramaturgo russo, sobre trapaças nas mesas de carteado, ganha montagem de Hugo Coelho
Corrupção de Gógol ressurge em peça
PEDRO IVO DUBRA
FREE-LANCE PARA A FOLHA
Mote da que talvez seja a peça
mais conhecida do russo Nicolai
Gógol (1809-1852) -"O Inspetor
Geral" (1836)-, a corrupção é tema também de "Os Jogadores",
texto do mesmo período, sem notícia de encenação no Brasil, que
inicia temporada hoje, com direção de Hugo Coelho, 48, na sala
Paschoal Carlos Magno do teatro
Sérgio Cardoso.
Se a primeira obra investe na hipocrisia dos habitantes corruptos
da província que bajulam um viajante por engano, por acreditá-lo
inspetor da capital, a última disseca as trapaças que povoam as mesas de carteado.
"O jeito de abordar o assunto se
parece com o do "Inspetor". O gênio corrosivo de Gógol nele permanece, talvez com mais sutileza,
cavalheirismo. A peça é uma reflexão sobre o jogo, trata do jogo
que estamos jogando, do jogo que
o Ocidente está jogando -um jogo de falsas alianças, de vigarice
com charme, de uma ética doentia", diz o encenador.
Coelho, que assinou "Poema
Sujo", de Ferreira Gullar, com Esther Góes e Rubens Corrêa, em
1980, também participa da peça
presente como ator. Na trama,
quatro jogadores, numa estalagem da Rússia czarista de 1830,
unem-se para depenar um velho
com posses. Como o homem não
se anima a jogar, sondam o filho,
que porta uma procuração para
movimentar o dinheiro do pai. A
comédia, a exemplo de "O Inspetor Geral", guarda um "turning
point" acerca das identidades,
que não deve ser adiantado.
Segundo o diretor, o texto original sofreu mudanças, que basicamente promoveram atualizações
(sem o acréscimo de "brasileirismos" ou de referências contemporâneas) de linguagem, além da
redistribuição isonômica de algumas falas entre as personagens.
"Houve uma "dramaturgia" no
texto, que foi escrito há mais de
150 anos. Precisamos fazer um
"aggiornamento". Mas, do ponto
de vista da duração, por exemplo,
está muito próximo do original."
Realizou a tradução e a adaptação
o ator e diretor Marcos Daud.
A direção de Hugo Coelho intenta sugerir o realismo que a
obra do criador de "Almas Mortas" comporta, sem exatamente
realizá-lo de maneira fotográfica
ou arqueológica. "Gógol é um
clássico. Como tal, permite uma
leitura cênica que vai da alta comédia à farsa, à sátira. Enveredei
pelos princípios da comédia clássica, sem me prender a truques fáceis, a apelos, tentando atingir a
inteligência do espectador", explica o encenador.
Para a criação do cenário foi
chamada a artista plástica e cenógrafa Heloisa Bortz, que já viajou
pelo interior da Rússia e que trilhou, como parte de seu processo
de pesquisa, antiquários e a rua 25
de Março atrás de referências.
De ascendência russa, ela utilizou objetos da família na encenação, tal qual o indefectível samovar (caldeira portátil que mantém
a água quente para a feitura, em
geral, de chá). Seu trabalho pretende citar artistas russos, entre os
quais sobressai o pintor Cerov,
que, no final do século 19, foi retratista de nobres.
"Os Jogadores" foi produzido
pelo ator Otávio Martins (ex-integrante da Companhia do Latão e
intérprete do espetáculo "Vestir o
Pai", de Mário Viana, dirigido por
Paulo Autran). Os figurinos são
de Bruno Otaviano e a luz foi desenhada por Luiz Fernando Vaz.
Agnes Zuliani (que fez Anita Malfatti em "Tarsila", de Maria Adelaide Amaral) é assistente de direção de Hugo Coelho.
OS JOGADORES. Texto: Nicolai Gógol.
Direção: Hugo Coelho. Com: Otávio
Martins, Edgar Castro, Barthomoleu de
Haro, Eduardo Semerjian, Hugo Coelho,
Alexandre Freitas, Luiz Serra, Robson
Nunes e Daniel Warren. Onde: teatro
Sérgio Cardoso - sala Paschoal Carlos
Magno (r. Rui Barbosa, 153, Bela Vista,
tel. 288-0136). Quando: estréia hoje,
para convidados, às 21h, e amanhã, às
21h, para o público; qua. e qui., às 21h;
até 1º/4. 75 min. 14 anos. Quanto: R$ 20.
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