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São Paulo, sábado, 15 de março de 2003

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OVELHAS QUE VOAM SE PERDEM NO CÉU

Bortolotto esboça sua geração em teatro blog sem acabamento

SERGIO SALVIA COELHO
CRÍTICO DA FOLHA

"O velhas que Voam se Perdem no Céu" segue a mesma estratégia de "O Herói Devolvido": sem pretensão nem acabamento, registra o depoimento de uma geração que chegou tarde para ser heroína da luta contra a ditadura, mas, nesses tempos pós-utópicos, desconfiando da esquerda e da direita, tem o cinismo blindado para oferecer como experiência de vida.
À frente do grupo Cemitério de Automóveis, seu exército de Brancaleone, Mário Bortolotto adapta agora o gaúcho Daniel Pellizzari. Continuamos nos bares da vida, sem glamour mas com humor, entre prostitutas raimundas e bêbados quase geniais.
Mas há uma sutil diferença entre as peças. Se Marcelo Mirisola, autor de "Herói Devolvido", fez seu universo girar em torno de um protagonista quixotesco, denunciando a mesquinhez da classe média, Pelizzari transita mais abertamente entre seus pares. Não tem postura de romancista, mas de quem escreve um blog, registro instantâneo de desimportâncias veiculado na internet.
Pinçando fragmentos não só do primeiro livro de Pellizzari, homônimo à peça, mas também de outras fontes, Bortolotto compõe um buquê tchekhoviano de medíocres intelectuais desiludidos, depressões afogadas no tédio, artistas sem causa e rebeldia curta.
Ligadas por conversas perdidas de bar, fábulas urbanas dão margem a curtas cenas entre dois ou três atores, quase "laboratórios" nos quais os atores experimentam sem pressa pausas e entonações.
Novamente o elenco é desigual, mas ninguém compete nem tenta impor estéticas. Compartilhando espaço com atores menos conhecidos, Renata Zhaneta faz uma prostituta burra e enternecedora, sem fazer alarde de sua técnica. Marcos Cesana brinca sem compromisso no episódio "Quatro Arestas". Fábio Espósito confirma seu talento tornando inesquecível um pequeno papel de bêbado. Sem retoques, só esboçado, como convém à geração internet.


Ovelhas que Voam se Perdem no Céu
   
Texto: Daniel Pellizzari Direção: Mário Bortolotto Com: Fernanda D'Umbra, Nelson Peres, Renata Zanetha e Ziza Brisola Onde: Espaço Cemitério de Automóveis (r. Cons. Ramalho, 673, tel. 3285-2850 Quando: sex. e sáb., às 21h, e dom., às 20h30. Até 30/3 Quando: R$ 5


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