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São Paulo, quarta-feira, 15 de outubro de 2003

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Tablado revira o centro da cidade

DA REPORTAGEM LOCAL

Uma das caçulas da cena teatral paulistana, a cia. Tablado de Arruar segue surpreendendo, inclusive aos próprios artistas. Leva hoje, à praça da Sé, seu segundo espetáculo, "Movimentos para Atravessar a Rua". Resulta do projeto Teatro de Rua e a Metrópole, selecionado este ano para o Programa de Fomento ao Teatro.
Trata-se do primeiro grupo escolhido com opção estética, ideológica e exclusiva pelo teatro de rua. A conquista de respeito vem desde a estréia profissional do Tablado, em 2002, com "A Farsa do Monumento".
Aquela peça retratava episódio histórico de 1900, em que um homem comum quebrou protocolo de cerimônia ao ajudar a descerrar o pano que cobria a estátua de Pedro Álvares Cabral, no Rio, notícia que foi distorcida à época do 4º Centenário de Descobrimento. Não se admitia que o gesto fora praticado por um negro.
A cidadania violentada um século atrás hoje é ainda mais esmaecida em "Movimentos para Atravessar a Rua". Durante três meses, o grupo frequentou o centro da cidade, familiar por conta da temporada da peça anterior. Realizou cenas de improviso, ouviu, viu e assimilou o "pega-pra-capar" cotidiano que envolve a sobrevivência de quem compartilha o miolo da metrópole.
A pesquisa deu em três núcleos que compõem a dramaturgia de "Movimentos...", de chave tragicômica. O primeiro episódio conta as peripécias de um sujeito que é demitido e só encontra "bicos" ou atalhos "mágicos" em sua jornada por um emprego. O segundo alude ao conflito entre camelôs e fiscais da prefeitura. A última parte trata de um acerto de contas entre dois moradores de rua.
O texto, enfim, brotou das ruas. Muitas vezes, fizeram parte das rodas de improvisação justamente camelôs, fiscais, desempregados, moradores de rua etc. A dramaturgia ganhou tratamento final de Pedro Mantovani, que também divide a direção com Heitor Goldflus (ligado à Cia. do Latão).
Segundo Goldflus, 40, a pesquisa de campo mostrou ao Tablado algumas contradições nos discursos hegemônicos de revitalização do centro velho de São Paulo. "Axiomas como o de que "camelô faz mal ao comércio formal" não se aplicam bem à prática. Alguns lojistas, por exemplo, chegam a proteger ambulantes ou mesmo a usá-los como revendedores."
"Movimentos..." quer trazer à luz um tanto do que tem sido jogado para debaixo do tapete. Não por acaso, um tapetão é valioso recurso cenográfico na rua do espetáculo. (VALMIR SANTOS)


MOVIMENTOS PARA ATRAVESSAR A
RUA. Texto: cia. Tablado de Arruar. Direção: Heitor Goldflus e Pedro Mantovani. Com: cia. Tablado de Arruar (Clayton Mariano, Daniele Ricieri, Demian Pinto, Lígia Oliveira, Martha Kiss, Rodolfo Amorim e Vitor Vieira). Figurinos e adereços: Daniela Cury. Quando: hoje, às 12h30, na pça. da Sé; 18/10, na pça. Ramos de Azevedo (12h30) e na r. Barão de Itapetininga (16h); e outras 16 apresentações. Quanto: entrada franca.


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