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Mostra destaca técnica da foto-pintura
Cerca de 60 imagens apresentam a arte popular do retrato em fotos pintadas e lambe-lambe na Pinacoteca do Estado
Técnica de colorir a superfície da imagem, tornando-a um híbrido entre foto e pintura, sobrevive ainda hoje
EDER CHIODETTO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Houve um tempo em que as
cores do mundo eram traduzidas unicamente em preto-e-branco na fotografia. Munidos
de pincel e muita técnica, alguns artesãos resolveram mudar isso e passaram a colorir a
superfície da imagem, tornando-a um híbrido entre fotografia e pintura. A mostra "Retrato
Popular", aberta hoje na Pinacoteca do Estado, surpreende
ao mostrar que tal técnica resiste até a atualidade.
A foto-pintura é, de modo geral, uma pintura colorida feita à
mão sobre uma ampliação fotográfica, geralmente um 3 x 4 em
preto-e-branco ampliado, com
o intuito de transformar e embelezar a imagem original sem,
no entanto, perder a verossimilhança com o retratado.
Essa era a única forma de se
obter uma imagem em cor, até
1935, quando o filme colorido
chega ao grande público com a
invenção do Kodachrome. No
interior do Nordeste brasileiro
há ainda, nas cidades mais retiradas, onde a fotografia digital
ainda não faz parte da rotina,
diversos artesãos que seguem
desenvolvendo essa técnica.
A extinção dessa forma de representação, porém, é iminente. Por causa da popularização
da fotografia digital, as indústrias estão deixando de produzir o papel fotográfico que atende a essa demanda.
"Creio que o fato da foto-pintura ter resistido nesses locais
até hoje se deva ao fator econômico, mas não só", diz a pesquisadora Rosely Nakagawa, que
compartilha a curadoria da
mostra com Titus Tiedl e Valéria Laena. "O retrato pintado
atende a um desejo da pessoa se
ver numa pintura, uma forma
de representação que ainda parece mais nobre que a fotografia", completa.
O retrato pintado pode ter finalidades bem curiosas, como
fazer com que pessoas que
morreram e possuíam apenas
retratos em preto-e-branco
apareçam agora com as faces
coradas e roupas elegantes. "Há
a história de um casal que era
católico e se tornou evangélico
após o casamento. Eles levaram
a foto do casamento para um
pintor que refez o retrato tirando o véu e as jóias da noiva",
conta Nakagawa. A foto-pintura não deixa de ser, portanto, a
antecessora do Photoshop.
Um dos destaques da mostra
é o módulo dedicado aos auto-retratos de Telma Saraiva, que
desde a década de 40 se dedica
à fotografia pintada no Crato,
Ceará. Para mostrar a seus
clientes como é possível deixar
as pessoas mais bonitas, eliminando traços indesejados como
olheiras e espinhas e melhorando o semblante do cliente
tal qual ele deseja, Saraiva pintou seus auto-retratos fotográficos no qual aparece de forma
bastante diferente entre eles,
sem, no entanto, ficar irreconhecível. Imperdível.
Sem ter claramente a intenção, tanto os auto-retratos de
Saraiva quanto a produção dos
outros foto-pintores se aliam
ao debate contemporâneo sobre realidade e mistificação na
fotografia, ao mesmo tempo em
que nos lembram que os retratos da nobreza feitos por pintores na era pré-fotografia não
passam de imagens idealizadas,
na qual o retratado dizia como
deveria ser imortalizado.
O que vemos nos museus e
cada vez mais nas fotografias
são ficções transformadas em
documentos.
RETRATO POPULAR - COLETIVA
Quando: de ter. a dom., das 10h às
18h; abre hoje, às 11h, com debate sobre fotografia popular, até 5/11
Onde: Pinacoteca do Estado (pça. da
Luz, 2, tel. 3229-9844)
Quanto: R$ 4 e grátis aos sábados
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