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MOSTRA
Ciclo exibe, a partir de hoje, 17 filmes sobre centros urbanos, como 'O Bandido da Luz Vermelha' e 'Metrópolis'
Cinemateca rege 'A Sinfonia da Cidade'
BERNARDO CARVALHO
especial para a Folha
A cidade é o tema do ciclo de 17
filmes que a Cinemateca Brasileira
exibe a partir de hoje, até domingo. A seleção vai desde o clássico
"Somente as Horas" (1926), de
Alberto Cavalcanti, até "Anjos da
Noite" (1987), de Wilson Barros,
passando pelo indefectível "Metrópolis", de Fritz Lang, além de
"Cidade Nua", de Jules Dassin, e
o belo "Noite Vazia", de Walter
Hugo Khoury.
Mas seria limitar o argumento
da mostra "A Sinfonia das Cidades" dizer que esses são filmes
"sobre" cidades.
Assim como os trens, as cidades
sempre foram mais que um tema
privilegiado do cinema. Elas estão
na origem das imagens em movimento e funcionam, por uma espécie de deslocamento analógico,
como uma representação da própria produção cinematográfica.
Não é por acaso que os pioneiros
do cinema, encantados com a
própria técnica, filmaram o que
analogicamente remetia ao que
estavam fazendo.
Não é à toa que o marco do nascimento do cinema seja o filme de
um trem entrando numa estação.
Ou que tantos filmes dos primórdios tenham se rendido a um dos
maiores fascínios da cidade: o de
ser a mais alta concentração de
movimentos simultâneos.
Cinco filmes da mostra são representativos de um olhar sobre a
cidade em que ela se basta. "Somente as Horas", "Berlim, Sinfonia de uma Cidade" (1927), de
Walter Ruttmann, "O Homem da
Câmera" (1929), de Dziga Vertov,
"Chuva" (1929), de Joris Ivens, e
"São Paulo, a Symphonia da Metrópole" (1929), de Rudolpho
Lustig e Adalberto Kemeny, fazem parte de um tempo de descoberta e fascínio em que o efeito
documentário, do simples registro das coisas, já era o espetáculo.
A forma espetacular, por exemplo, com que o russo Vertov consegue refletir e celebrar o próprio
meio com que trabalha (sua câmera), transformando o cinegrafista em herói dos tempos modernos, ao registrar, selecionar e
montar os movimentos urbanos,
não deixa dúvidas ainda hoje
quanto à sua inovação.
É verdade que em grande parte
essa explosão de encanto com a
técnica terminou, por influência
dos movimentos das artes plásticas nas primeiras décadas do século, sendo encaixada em um nicho futurista ou formalista que
muitas vezes escondia, atrás de
um verniz cultural e artisticamente "mais elevado", a poesia mais
específica desse deslumbramento
com a essência documentária da
imagem cinematográfica.
Em Vertov, por exemplo, o homem e a câmera, a subjetividade e
a objetividade, estão integrados
pelo movimento de uma totalidade urbana. É desse cinema militante e utópico na defesa de uma nova
percepção do mundo que vem grande
parte da poesia dos filmes que tentam
escapar a uma linha narrativa tradicional para nunca deixar o espectador
perder de vista o que é a essência heróica e trágica do cinema: a capacidade de registrar o que vai morrer.
É da vontade inocente e bruta de expor essa essência que se alimentam
obras-primas do ciclo, como "A
Margem" (67), de Ozualdo Candeias,
em que São Paulo se ergue como representação melancólica do que o cinema nasceu para ser: uma sinfonia
de movimentos que, sem ele, estariam
condenados a se perder para sempre.
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