São Paulo, segunda-feira, 21 de fevereiro de 2000


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CRÍTICA

Trilha de "Ripley" é repleta de "replays"

CASSIANO ELEK MACHADO
da Reportagem Local

Perdão aos que têm horror a trocadilhos, mas não há nenhuma palavra melhor para abordar a trilha sonora de "Ripley" do que "replay".
É de repetições novas ou envelhecidas, bem costuradas ou esfarrapadas, que é feito o conjunto de canções do filme de Anthony Minghella, que chega às lojas de CDs ao mesmo tempo que nas salas de cinema.
Por "replay", entenda-se, sobretudo, falta de originalidade. Não há nada de realmente novo no CD homônimo ao filme. O que vale, inclusive, para os temas que foram compostos para a trilha e que, por sua obviedade, soam como velhos conhecidos antes mesmo de chegarem aos ouvidos.
O frescor, paradoxalmente, exala das composições mais antigas do CD, apresentadas em gravações dos anos 50 ou 60.
Ainda que repetida à exaustão, uma gravação do pai do bebop Charlie Parker tocando seu espevitado tema "Ko-Ko" nunca deixará de ser refrescante.
Igualmente viçosa é a faixa "The Champ", em que outro sacerdote do bebop, Dizzy "Bochechas" Gillespie, depois de um debochado scat (improviso vocal), demonstra todo o furor que conseguia retirar de seu trompete.
O triunvirato de obras-primas do CD (o que já torna sua aquisição um negócio bem pensável) é completado com versão não tão difundida da macia "Nature Boy", com o trompete de Miles Davis escoltado com elegância pelo vibrafonista Teddy Wilson.
Terminam aí as reprises. Começam os "remakes".
O primeiro é, de longe, o mais saboroso. O ator Matt Damon, que já trabalhou como produtor e roteirista, lança-se à cantoria e grava um "replay" bastante digno da interpretação original de Chet Baker para "My Funny Valentine".
Veja bem, digno. Mesmo que com desafinadas esporádicas, da frase "make me smile", no início, até o apoteótico "stay", no final.
A mesma dignidade escapa dos simulacros "Moanin'" e "Pent-up House", canções de primeira linha do jazz que ganham releituras (ou melhor, cópias) no comando do opaco trompetista britânico Guy Barker.
Os "replays" de "Ripley" não param nessas categorias. Pior do que as reprises de gravações clássicas ou os "remakes" são as repetições internas.
A reprodução exaustiva de um tema dentro de uma mesma composição é frequente no repertório erudito. Na trilha pouco erudita de "O Talentoso Ripley", porém, o padrão musical que é apresentado na faixa "Italia", e que tem recorrências em outras seis, lembra um cartão-postal. Um postal sem nada escrito no verso, sem alma.
Em sua essência, as sete faixas compostas pelo libanês Gabriel Yared ("oscarizado" por "O Paciente Inglês", do mesmo Minghella) parecem existir apenas para regular o nível de tensão. É essa a palavra sussurrada continuamente pelos violinos em "stacattos" de montanha-russa: tensão, tensão, tensão. Palavras repetidas.


Avaliação:   

Disco: O Talentoso Ripley
Gravadora: Sony
Quanto: R$ 20, em média


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