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CINEMA
Cineasta lança "Uma Vida em Segredo", adaptação de livro de Autran Dourado, 17 anos após "A Hora da Estrela"
Suzana Amaral (re)encontra o público na tela
Divulgação
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Sabrina Greve, em cena de "Uma Vida em Segredo" |
SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL
A estréia de "Uma Vida em Segredo", na última sexta, foi um
encontro ou um reencontro da cineasta Suzana Amaral, 70, com o
público. Para quem aplaudiu em
85 sua estréia com o premiado "A
Hora da Estrela" cessa a curiosidade pelo segundo passo de sua
carreira no formato de longa-metragem em 35 mm, o mais prestigiado entre todos do cinema.
A geração que desconhece sua
adaptação da obra literária de
Clarice Lispector verá na tela pela
primeira vez uma diretora que, no
entanto, não se ausentou do ofício. "Não parei esse tempo todo",
diz, na entrevista a seguir.
Tampouco pretende parar. Ao
contrário, tem elenco definido
(Paulo Miklos, Matheus Nachtergaele, Lázaro Ramos e Malu Mader) para o próximo filme, "Hotel
Atlântico", baseado em livro de
João Gilberto Noll, a ser rodado
desta vez em vídeo digital.
Folha - Com o sucesso de "A Hora
da Estrela" (85), você sofreu a "síndrome do papel em branco", o temor de se arriscar em outra obra?
Suzana Amaral - Absolutamente.
Desde então, não fiz longas-metragens, mas não parei de trabalhar. Dirigi uma minissérie em
Portugal, muitos filmes documentários e institucionais e escrevi quatro roteiros. Sobrevivo de
cinema. Todo esse tempo tive de
batalhar minha sobrevivência,
mesmo na era Collor. Isso sem
contar que passei quase quatro
anos viajando para promover "A
Hora da Estrela", que foi vendido
para mais de 20 países.
Até ganhei a Ordem do Rio
Branco, de tanto promover o Brasil lá fora. Se eu estiver trabalhando em cinema, tanto faz que seja
um longa, um curta, um documentário, um institucional.
Folha - Você percebe algum parentesco literário entre Clarice Lispector, Autran Dourado e João Gilberto Noll, os autores que elegeu
para adaptar ao cinema?
Amaral - Existem dois tipos de
filmes: os de personagem e os de
trama. Dou preferência aos de
personagem. Em preferindo filmes de personagens, tenho uma
inclinação pelos desencaixados,
problemáticos, fora do comum.
Acho que é essa preferência que
me faz escolher esses livros.
Folha - A que se deve o seu êxito
na escolha dos intérpretes desses
personagens?
Amaral - Para cada filme você
tem que fazer uma busca. Mas, à
medida que o tempo foi passando, fui desenvolvendo e aprimorando um método de trabalho.
Não me desvinculo de tudo isso.
Sou zen-budista. Li que o Antunes Filho tem todo um trabalho
teatral fundamentado no zen-budismo. Isso me atraiu. Fui ver o
trabalho dele já disposta a encontrar alguém, porque sabia que
quem estivesse lá iria falar a mesma língua que eu.
Quando cheguei, a Sabrina
[Greve, a Biela, protagonista de
"Uma Vida em Segredo"" estava
fazendo um personagem completamente diferente da Biela. Era
uma pivete, uma menina de favela
muito desabusada. Mas tenho
uma intuição, uma voz interior.
Acho que meu anjo da guarda é
diretor de cinema. Ele realmente
me apontou, e eu fui nessa.
Folha - Você considera equivalentes os desempenhos de Marcélia
Cartaxo em "A Hora da Estrela" (Urso de Ouro em Berlim) e Sabrina
Greve em "Uma Vida em Segredo"
(melhor atriz nos festivais de Brasília e Ceará)?
Amaral - Não. Não tem nada a
ver. Considerando os personagens, um é simplório e o outro é
simples, nuanças que para mim
são muito grandes. Outra diferença é que a Sabrina tem uma formação teatral que a Marcélia não
tinha. Sabrina e eu tínhamos uma
linguagem comum. Talvez na
época de "A Hora da Estrela" eu
trabalhasse com uma interpretação cinematográfica mais ao estilo Actor's Studio. Fui modificando isso e hoje fico mais na realidade do fazer, no aqui e agora.
Não quero que as pessoas representem. Não quero insights emocionais, memória afetiva. Proíbo
formalmente isso. Acho que o cinema deve funcionar na base do
"menos é mais". Defendo o minimalismo em todos os sentidos.
Por que usar dois violinos se com
um eu toco a música?
Folha - É fato que num debate no
Cine Ceará você e o cineasta Jorge
Furtado ("Houve Uma Vez Dois Verões") polarizaram opiniões? Você,
na defesa de um cinema brasileiro
radicalmente autoral. Ele, advogando a existência de um cinema
de maior comunicação popular?
Amaral - Houve uma polêmica.
Tive de sair antes para viajar a
Moscou e não cheguei a ouvir o
ponto de vista dele, mas sei que
ele faz um cinema completamente diferente do meu. Acho que o
cinema no Brasil, indo na direção
da televisão, está sendo infiel ao
cinema. O cinema internacional
feito por jovens continua fiel ao
cinema com "c" maiúsculo. Aqui,
o cinema feito por jovens enveredou para o cinema televisivo.
A continuar assim, vamos ter
programas de televisão passados
em tela grande. Então, para que
fazer cinema, já que é muito mais
barato fazer TV? Nesse caso, que
se faça TV, e não cinema.
É meu ponto de vista, mas também defendo até à morte o direito
de eles fazerem. Não sou radical,
mas continuarei fazendo os meus
filmes sem concessões.
UMA VIDA EM SEGREDO.
Direção: Suzana Amaral.
Com: Sabrina Greve.
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