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DANÇA
"Trapiche" busca um outro país dentro de nós
INÊS BOGÉA
CRÍTICA DA FOLHA
"Trapiche ", o mais recente
trabalho da Cia. Oito Nova
Dança, foi desenvolvido na comunidade do Marujá (Ilha do
Cardoso), com propostas de "resgate, memória e transformação"
do fandango. Dança aqui é investigação e invenção: respostas e desafios para o entendimento de
uma cultura ameaçada. Não só a
da pequena comunidade litorânea, mas a de todos nós, no desterro de tempos vazios.
Parte do material recolhido por
Lu Favoretto e seu grupo fica à
mostra antes do espetáculo, numa exposição de fotos e vídeos.
São imagens editadas do processo
de criação, incluindo dança e música dos próprios habitantes da
comunidade.
No mesmo espírito integrativo,
o espetáculo começa na platéia,
com música (canto, violões, rabeca) e dança (o fandango). É a raiz
de tudo o mais -referências à
cultura marujaense pontuam o
espetáculo, do início ao fim. São
marcas claras, lindas nos corpos
de quem dança.
Se a música não tem muita variação ou desenvolvimento, não é
isso que importa. Ou importa,
mas noutro sentido: pois é no momento em que os gestos conhecidos começam a falhar que chega a
hora da mudança. Distanciando-se das formas de vida encontradas, a dança envereda por labirintos de outra natureza.
Solos instigantes e danças de
grupo fazem esforço para se renovar, o que implica uma dose de
perigo quando isso vira um repertório de símbolos.
Mas um espetáculo que se apresenta como processo há de crescer com o tempo. O vaivém no
trapiche -ancoradouro e ao
mesmo tempo lugar de passagem- merece respeito e atenção,
mesmo quando seu sentido ainda
parece em luta consigo. Talvez
nisso também a cia. tenha lições
para nos dar. Não são muitos que
têm a coragem de buscar outro
país dentro de nós; e a matéria
mais viva da dança não se entrega
facilmente a nenhum de nós, desterrados.
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