São Paulo, quinta-feira, 27 de maio de 2004

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ERUDITO

Mezzo-soprano se apresenta hoje e amanhã no Sesc, em concerto em que seu canto "ao vivo" é sobreposto a gravações

Kieffer processa e reprocessa voz em show

JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL

A mezzo-soprano Anna Maria Kieffer lança com espetáculos hoje e amanhã, no Sesc Vila Mariana, o CD "Caminhos da Voz", que é em verdade o resultado de um projeto de pouco mais de duas décadas em que intérpretes se sobrepõem a gravações de suas próprias vozes transformadas por meios eletroacústicos.
Não será apenas um concerto. Além de Kieffer e do baixo Eduardo Janho Abumrad, as peças do compositor belga Leo Kupper serão "encenadas" sob a direção de Caio Gaiarsa e servirão de motivação para que três artistas plásticos - Alessandra Galasso, Eduardo Campos e Chico Escher- produzam durante o espetáculo formas em movimento.
Kieffer é cantora lírica e pesquisadora com dupla carreira. De um lado, foi quem se interessou e gravou peças do período colonial brasileiro e canções de Alberto Nepomuceno. De outro lado, integrou as vanguardas musicais a partir dos anos 70 e foi a responsável por duas sínteses de correntes musicais contemporâneas -John Cage e o minimalismo- em bienais dos anos 80. A seguir, a entrevista da cantora.
 

Folha - Como definir "O Caminho da Voz"?
Anna Maria Kieffer -
A partir de 1982 eu e o Leo Kupper iniciamos um trabalho em busca da "música fonética", que trabalha com fonemas e ruídos, técnicas não ocidentais e cria um texto sem significado semântico.

Folha - Como se dá concretamente a apresentação?
Kieffer -
Eu já trabalhava com a busca de novos sons para a voz, embora minha formação seja a de cantora lírica tradicional. Desenvolvi um trabalho no instituto de Bruxelas que Kupper dirige. As gravações foram retrabalhadas por meio de mídias digitais. Quanto ao espetáculo propriamente dito, são a minha voz e a voz do Eduardo Abumrad que são reproduzidas ou reprocessadas, e sobre elas as nossas vozes se enunciam em tempo real.

Folha - Ou seja...
Kieffer -
...Temos um material de base, que foram criações vocais minhas, em estúdio. Essas criações foram retrabalhadas em mídias digitais. E durante o espetáculo eu me sobreponho a essa base sonora com a minha voz em tempo real.

Folha - Qual é hoje o público dessa "vanguarda"?
Kieffer -
Eu já não chamo mais isso de vanguarda. Essa palavra já morreu. É algo diferente, com outra visão de trabalho. É pesquisa. Há o encontro, no espetáculo, da música com as artes plásticas.

Folha - Uma parcela da juventude sem formação erudita se aproxima desse trabalho pelo apego que ela tem à música eletrônica?
Kieffer -
Acabei de fazer uma obra com o Vanderlei Lucentini. Foi uma trilha sonora para uma exposição. Alguns DJs me ligaram e pediram permissão de utilizar esse trabalho. Eu não imaginava que fosse dar essa volta. Há alguns anos eles não eram o meu público. Mudamos todos, e hoje nos encontramos. Eu fico feliz, vejo isso com muitos bons olhos.

Folha - Como conciliar essa faceta de sua carreira com a parte mais tradicional, da música colonial ou de Alberto Nepomuceno?
Kieffer -
Não vejo tanta diferença assim. Em termos de música antiga do Brasil, há uma recriação de obras esquecidas. Há filtros nessa recriação. Fazer isso é tão interessante e tão importante quanto o trabalho com a música completamente nova.


ANNA MARIA KIEFFER. Onde: Sesc Vila Mariana (r. Pelotas, 141, tel. 5080-3000). Quando: hoje e amanhã, às 21h. Quanto: de R$ 5 a R$ 15.


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