São Paulo, terça-feira, 28 de março de 2006

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É TUDO VERDADE

Debate no Itaú Cultural serve como ponto de partida para análise do documentarista e crítico franco-belga

Bernardet ganha retrospectiva documental

Divulgação
Cena de "Crítica em Movimento", documentário de Kiko Mollica que faz parte de panorama que homenageia Jean-Claude Bernardet


SÉRGIO RIZZO
CRÍTICO DA FOLHA

O s 70 anos de Jean-Claude Georges René Bernardet são celebrados pela 11ª edição do É Tudo Verdade - Festival Internacional de Documentários com um ciclo de sete filmes (cinco dirigidos ou co-dirigidos por ele, outros dois sobre ele) e com a primeira mesa de debates da 6ª Conferência Internacional do Documentário, que começa hoje no Itaú Cultural.
Cidadão francês nascido no sul da Bélgica, Bernardet vive no Brasil desde 1949 e se naturalizou em 1964. Sua notável contribuição ao audiovisual brasileiro foi construída como crítico, ensaísta, professor da Universidade de Brasília e da Universidade de São Paulo (USP), ator, roteirista, produtor e diretor. Diversas gerações de cineastas e pesquisadores aprenderam a dialogar com sua obra como referência obrigatória.
A reflexão sobre o documentário exerce papel importante ao longo de toda a sua trajetória, mas se encorpa decisivamente em "Cineastas e Imagens do Povo", publicado pela Brasiliense em 1985, antes que o autor tivesse visto "Cabra Marcado para Morrer" (1984), de Eduardo Coutinho, considerado por ele um "divisor de águas". Ao mesmo tempo em que o filme confirmaria idéias do livro, o livro permitiria "compreender melhor o "Cabra'".
Coutinho estará hoje no debate em homenagem a Bernardet, às 14h30, que reunirá Amir Labaki, diretor do festival e articulista da Folha, o artista multimídia Kiko Goifman ("33") e o professor e cineasta Carlos Augusto Calil, secretário municipal de Cultura e colega de Bernardet durante muitos anos no departamento de cinema, rádio e TV da Escola de Comunicações e Artes da USP.
"Cineastas e Imagens do Povo" analisa documentários brasileiros realizados entre 1960 e 1980. A preocupação não é a de fazer um panorama histórico, mas estudar a "crise" que nasce do questionamento do "modelo sociológico", cujo apogeu ocorreu em 1964-65.
Clássicos como "Viramundo" (1965), "Subterrâneos do Futebol" (1965), "Maioria Absoluta" (1966), "A Opinião Pública" (1966) e "Greve" (1979) - que teve cenas utilizadas em "Peões" (2004), de Coutinho - são analisados para examinar, entre outros aspectos, qual seria a fronteira entre o "modelo sociológico" e o que lhe sucede, além do que assinalaria tal ruptura na linguagem.
"Acredito que três elementos principais", responde Bernardet. "Deixar de acreditar no cinema documentário como reprodução do real, tomá-lo como discurso e exacerbá-lo enquanto tal; quebrar o fluxo da montagem audiovisual e desenvolver uma linguagem baseada no fragmento e na justaposição; opor-se à univocidade e trabalhar sobre a ambigüidade."
O ciclo de filmes que integra a homenagem se presta também à apresentação da obra do ensaísta, com a exibição de "Território Crítico" (2001), de Ricardo Miranda, e "Crítica em Movimento" (2004), de Kiko Mollica. Conhecida a teoria, pode-se conferir a prática - e se verá então que, na obra de Bernardet, uma e outra se apresentam como campos complementares e intercambiáveis.
A ponte se faz mais evidente, entre os documentários realizados por Bernardet, em "São Paulo, Sinfonia Cacofonia" (1994) - releitura de imagens da cidade no cinema tendo como interlocutor "São Paulo, Sinfonia de uma Metrópole" (1929), de Adalberto Kemeny e Rodolfo Lustig, e a matriz inspiradora deste, "Berlim, Sinfonia de uma Metrópole" (1927), de Walter Ruttmann - e em "Sobre Anos 60" (1999), outro esforço de montagem que olha para o Brasil do período a partir de perspectiva muito particular.


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