São Paulo, Segunda-feira, 28 de Junho de 1999
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O BOM DO DIA
Filme de Zé Celso e Noílton Nunes é de 82
Cinemateca exibe "O Rei da Vela"

PAULO SANTOS LIMA
free-lance para a Folha

"O Rei da Vela", não a peça de teatro, mas o filme de José Celso Martinez Corrêa e Noílton Nunes, concluído em 82, é exibido hoje em sessão especial na Sala Cinemateca (leia detalhes no roteiro ao lado).
Não é uma obra só para os amantes do teatro. Ao contrário, há muito de cinema ali e, principalmente, um registro pertinente da história do Brasil nos últimos 40 anos.
"O Rei da Vela" junta imagens alegóricas e trechos de filmes com a remontagem que foi feita da peça em 71. O discurso continua sintonizado com o mitológico espetáculo criado por Zé Celso em 67 -sobre o texto original de Oswald de Andrade (33)-, na reabertura do teatro Oficina.
Mais do que um teatro, o Oficina da década de 60 esteve à frente de um movimento que buscava renovação linguística em meio aos discursos de contestação da situação política brasileira -o que envolvia ainda outros meios, como o cinema e a música popular, com figuras como Glauber Rocha e Caetano Veloso.
O grupo se mostrou sintonizado, no palco, com os movimentos que pipocavam no mundo inteiro. Aplicou o ideário brechtiano, utilizando as técnicas de distanciamento -que fazem com que o público se veja fora do espetáculo e se atenha ao discurso. Fugiu também das histórias lineares, para impor um diálogo direto com o público, assim como fez o cinema novo.
Um ano após o Oficina ter se incendiado (em 66), a reabertura com "O Rei da Vela" deslumbrou muitos e chocou outros tantos. Rodou o Brasil inteiro e marcou a carreira tanto de Zé Celso como do ator Renato Borghi.
Abelardo 1º, um personagem-síntese da elite brasileira, é considerado o papel mais destacado de Borghi no teatro. O ator, por sinal, deve empreender uma remontagem, dirigida pelo mesmo Zé Celso, mais de 30 anos depois.
No longa-metragem que passa hoje, Borghi reproduz para a câmera sua interpretação de Abelardo 1º, e José Wilker faz Abelardo 2º. As duas atuações, no cenário giratório criado então para o teatro Oficina, são pontos altos no filme.
As cenas externas, rodadas depois da montagem de 71, não negam o cinema. Amarram as passagens históricas que trazem Getúlio Vargas, a repressão policial e outras.
O discurso estético de Oswald de Andrade, "roubado" por Zé Celso e Noílton Nunes neste "O Rei da Vela", discurso em que a antropofagia propõe um modelo de contestação do imperialismo, se mantém atual. É algo que a crise brasileira, hoje, faz com que seja até mesmo emergencial.
Como na mostra "Cinema, Teatro e Psicanálise", a Sala Cinemateca programou um debate para depois da exibição de "O Rei da Vela". A discussão reunirá o crítico Aguinaldo Ribeiro da Cunha, a professora de literatura da Unicamp Orna Messer Levin e o co-diretor do filme Zé Celso.


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